terça-feira, 16 de dezembro de 2014

DEVANEIOS E BABAQUICES

Não sei como, mas o galo conseguiu escapar heroicamente do despacho no qual seria sacrificado e os atendentes do posto de gasolina se comoveram com o fato e resolveram adota-lo. 

Construíram até uma casinha pra ele numa diminuta praça triangular aqui de Petrópolis.

É um galo reluzente, bonito, fortão, que fica ciscando o dia inteiro no gramadinho junto a um sinal, num local onde o trânsito é muito intenso.

Sempre se disse que galináceo é bicho burro, mas nunca ouvi falar de galinha atropelada. Gato e cachorro tão sempre dançando na via, mas a galinha sabe viver tranquilamente à beira da estrada. Nunca é colhida.

Já faz anos que o galo está ali. Dizem que no fim da tarde ele atravessa a rua e vai dormir num matagal que tem ao lado.


Ouvi dizer também que os caras do posto trouxeram uma galinha pra fazer companhia ao bicho e dia destes fui caminhar por ali por perto e vi de longe, na pracinha, as silhuetas do galo e de uns animaizinhos menores, que pareciam caminhar animadamente sobre ele. O valente galinho constituiu família. Não é um final mais do que feliz pra quem ia ter seu pescoço torcido?

Hoje passei pelo local e lembrando da cena da família galinácea, me veio à cabeça o filme de Martin Scorsese de 1988, “ A última tentação de Cristo”.

Fiquei impressionado na época, com o tema que mostrava Jesus na cruz em meio aos delírios daquele martírio todo, imaginando que bom mesmo teria sido ser uma pessoa normal, ter uma profissão, uma família, uma casa. E não sacrificar-se.

Os pensamentos voam, se ligam e logo me vem também um pouco de política. A ideia de que Cristo era na verdade apenas um homem com ideias socialistas e igualitárias e a Globo da época negou esta realidade, e inventando um deus, escreveu um livro grosso que contou a história oficial e de lambuja também criou o negócio mais rentável da humanidade. A Igreja.

Lembrei logo depois disso daquela do Magro do Bonfa que tá no Brique da Redenção olhando uns crucifixos. Se interessa por um e quer saber o preço.

- Quanto custa esse?

- É quinze reais.

- Quinze? E sem o magrão?



Comecei falando sobre galo e acho que devo terminar falando também sobre galo.

Seu Lauro tinha uma fazendinha e criava aves de toda espécie.

Ele gostava muito de sua criação e tinha um papagaio que falava muito.

Seu Lauro queria saber por que os outros animais não falavam como o loro.

Começou a pesquisar. Pegou um garnizé no poleiro e reparou que a plumagem era igual a do loro, assim como os pés também não diferiam do papagaio falante.

Abriu a boca do loro e viu que o loro tinha uma língua pontuda e quando abriu a boca do garnizezinho viu que ali estava a grande diferença.

O galinho também tinha uma língua pontuda, mas havia uma bolinha grudada nesta ponta. Seu Lauro chegou a uma conclusão lógica.

- Mas claro, tchê. É esta bolinha que impede o garnizé de falar.

Foi lá no quarto, pegou a tesourinha da mulher, abriu a boca do bichinho e pronto! Cortou a bolinha atrapalhadora. O garnizé deu uma boa cuspida, olhou bem pro velho e arrematou.

- Obrigado, Seu Lauro!!!



FC dezembro 14

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