terça-feira, 17 de outubro de 2017

O GORDINI

Tinha eu quatro ou cinco anos de idade quando, certa feita, vínhamos da praia no Gordini que meu pai havia recém comprado e fizemos uma parada numa concessionária Willys Overland para, ora vejam só que tão priscas eras, ser instalado um porta luvas no carrinho.

No momento em que estacionávamos em frente ao estabelecimento, passou caminhando por nós um homem que levava nas mãos duas galinhas gordas e minha avó sugeriu que se comprasse uma franga daquelas para ser preparada na janta.


Meu pai ficou furioso com a disparatada ideia e nem pensar que alguém ousasse introduzir um animal daqueles no seu novíssimo e reluzente Gordini.

O Gordini era filho do Dauphine e depois viria a ser o pai do Corcel. Era assim que eu enxergava os laços que uniam os automotores.

Mas retornando...

Enquanto meu pai, dentro da loja, regateava o preço do acessório e sua instalação, lá fora minha avó, mandando às favas a proibição, fazia um bom negócio com o andarilho. Colocou então a penosa dentro de uma caixa de papelão e a depositou sigilosamente sobre o banco de trás, entre ela e eu.

Meia hora depois, estávamos já na estrada, e faltavam poucos quilômetros para chegarmos a Porto Alegre, quando aconteceu o que não devia. A franga resolveu se expressar. Deu uma curta e grossa cacarejada. Meu pai, ouvindo aquilo, começou a sapatear ao volante, se pôs a gritar e a urrar impropérios e como resposta, obteve apenas o silêncio aturdido de minha mãe e minha avó. Foram uns quinze minutos de rezingamentos e acusações aos quatro ventos.

Mais tarde, Dona Maria Bonetti Villeroy torceu o pescoço do pobre animal, depenou-o, deu-lhe tempero, levou-o ao fogo e logo depois à mesa.

Meu pai, apesar de contrafeito, comeu. Comeu e repetiu.

Em total silêncio.

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