quarta-feira, 7 de abril de 2021

PANOS DE PRATO


Estou no sinal e há vários meninos vendendo badulaques ou simplesmente pedindo. Resolvo comprar panos de prato do primeiro que se aproxima do carro. São cinco panos de prato por dez reais. Dou-lhe vinte e digo que fique com o troco. O menino se vai, apressado, sem mudar a fisionomia concentrada. No seu lugar eu também não sorriria.
- Pano de prato nunca é demais.
É o que diz minha mãe no momento em que chego em casa e ponho os panos em cima do balcão.
Lembro deste fato no momento em que sinto o sol queimando minhas costas. Estou na área, pendurando panos de prato na corda. O céu é de um azul que me parece obsceno, pois até a natureza quando fabulosa acaba ofendendo nosso luto e desespero. Esse lindo dia, neste exato instante, ironicamente, está acompanhando a dor e a desgraça de muita gente.
Penduro os panos com cuidado, pois minha mãe andou criticando meu trabalho.
- Deixa que eu penduro os panos.
- Por?
- Contigo os panos resultam amarfanhados.
Fiquei surpreso com a palavra e alguns dias depois, para me certificar, pergunto.
- Por que não queres mesmo que eu pendure os panos?
- Tu deixa tudo engruvinhado.
Daí achei demais. Pensei que estava enganada, ou até mesmo inventando. Então fui até o dicionário. Estavam ali os dois sinônimos de amarrotado.
Então por isso estou caprichando nessa tarefa de pendurar os panos de forma que fiquem o menos amassados possível.
O sol na pele me dá prazer, assim como o cheiro de lavanda que os panos exalam. É um bom momento. Ficar longe do noticiário e das redes por por alguns instantes dá uma acalmada na alma que tem corcoveado bastante.
Eu poderia trabalhar nisso, já que não tenho mais profissão. Dependurar panos recém lavados. Num varal gigantesco, montado em cima de um gramado também imenso.
Seria meu novo ofício. Dependurar diariamente alvíssimos e cheirosos panos de prato num varal infinito que formaria uma paisagem silenciosa de bandeira tremulando ao vento e tenho certeza de que isso traria descanso para o espírito de quem passasse por ali, parasse um pouco, e dirigisse seu olhar por algum tempo. Depois disso, eu poderia sugerir fechar os olhos e sorver com cuidado aquela atmosfera de amaciante, fresca, úmida. Poderia sugerir também que.
- Óh. Presta atenção neste ato tão simples. Só respirar já é bom. Está sentindo?
Depois, no fim de tarde e fim da labuta, pegaria minha bicicleta e pedalaria sem pressa por trilhas com o mar pertinho. Chegaria em casa, cevaria um mate, ligaria o rádio e, enquanto a água aquecesse, ouviria notícias interessantes sobre como a neve, este ano, chegou bem mais cedo à Europa ou que a prefeitura resolveu reformar o porto e desta vez é pra valer e parece que é uma boa ideia que todos vão aproveitar.
Vou pensando nestas bobagens até pendurar o último pano.
Entro, preparo o café e sento para esperar que o sol de lança chamas termine minha tarefa. Depois recolho, dobro, organizo por tamanho e empilho de maneira que caibam todos na gaveta, da forma mais exata para que não fiquem nem amarfanhados nem engruvinhados.
Reparo que meu cuidado ao pendurar, realmente facilita a tarefa de dobrar e acondicionar.
Trabalho concluído, ligo a TV. Mergulho novamente nas labaredas.

PAZUELLO E A CHEFIA

- E aí, chefe?
- Fala, Pazuello.
- Tá muita pressão.
- E eu não sei?
- Galera tá querendo vacina e a vacina tá pouca. Tô me virando como posso, chefe.
- Você tá indo muito bem nisso daí, Pazuello. Vai chutando. Segue nisso daí.
- Mas não param de perguntar sobre a porra das vacinas. Muita pressao, pô!
- Continua chutando. Diz qualquer coisa. Enrola eles que eles engolem.
- Mas até o Supremo tá no meu pé, chefia!!
- Não dá nada, parceiro. É só mimimi do Supremo. Eles só ferram quem mexe com eles, tipo o grandão e aquela Sara. No mais é só teatro.
- Tô com medo que dê merda, chefe.
- Tá com medo que dê merda, Pazuello??? Kkkkkkkkkkkkkkkk
- Que foi?
- kkkkkkkkkkkkkkk Tá com medo que dê merda??? A merda já deu. kkkkk
- Já?
- Claro que já, porra. A merda somos nós, Pazuello kkkkkk
- Somos nós, chefia?
- Somos nós sim, Pazuellozinho. Kkkk
- Kkkkkkkkkkkk
- Você tá rindo, Pazuello?
- Não, chefe. O que é isso. Jamais riria disso.
- Ah, tá.
- Mas, chefia. O senhor não tem medo de nada? Medo do povo?
- Pro povo dou o auxílio e o povo come na minha mão, porra!!! E essa galera tá morta, parceiro. Até os vivos tão mortos nisso daí.
- Então não tem medo de nada.
- Vou falar pa tu, Pazuello, que é meu amigo. Só tenho medo de uma parada aí.
- Do Lula, chefe?
- Nahhhh!!!! O Lula cortam as pernas dele daqui a pouco, pô!
- Do que então?
- Tenho medo só do véio da havan. Kkk
- Mas esse é nosso, chefia.
- Enquanto os empresários estiverem do nosso lado, tamos tranquilos nisso daí.
- E por que eles mudariam de lado?
- Só se eu entrasse pro PT. Kkkkkkkk
- kkkkkkkkk
- kkkkkkkkk.
- Mas o senhor não vai fazer isso, né chefia?
- Porra, Pazuello. Às vezes tu parece mais burro do que eu! Kkkkkkkk
- kkkkkk
- Segue chutando, Pazuello. Segue enrolando. Tás indo muito bem nisso daí. Um beijo na bunda. Kkk
- Abraço, chefia.

BEIJOS E TALS



A vó Venuta vinha beijar a gente e eram vários beijinhos dados numa pressão tal que rolavam uns assoviozinhos altos pra caramba, bem fininhos, que deixavam a gente numa surdez bárbara por uns dois minutos.

Resulta que um tempo desses eu conheci uma moça bacana, elegante, bem conversada, mas que tinha um beijo assim, estilo vó Venuta, assoviadinho, e, quanto mais o troço esquentava, quanto mais a volúpia se apresentava, mais vó Venuta ficava o lance e mesmo quando ela não beijava o rosto ou a boca, não sei se você me entende, era aquela parada tri vó Venuta e eu ficava olhando praquilo me concentrando ao máximo, mas infelizmente sobrevieram as mega brochadas vó Venuta e ficamos deveras preocupados, mas acabei por não revelar o meu real motivo para aquele insucesso, com medo de ouvir impropérios e até mesmo levar algum tapa na cabeça, cosa que até poderia ser interessante, não é?
Correlata a isso, é uma história do mundo da bossa nova que tento contar, agora talvez mentindo um pouco menos.
Diz que na década de 60, o jornalista Antonio Maria, entrou no avião no Santos Dumont pra se dirigir a São Paulo.
Naquele tempo não havia rigidez nos protocolos aeronáuticos e Vinícius de Morais entrou junto na aeronave e ficaram ali, bêbados, jogando fora uma última conversinha, antes da decolagem.
Por fim abraçaram-se, Vinícius se retirou e decolagem feita, Antonio Maria passou a entabular um papo com sua vizinha de poltrona, que, equivocadamente, pensou que ele fosse Vinícius e o jornalista, malandramente, deixou assim, não desfez o engano e conversa vai, conversa vem, os dois se agarram ali mesmo, em pleno vôo.
Uma semana depois, os dois amigos voltam a se encontrar em Ipanema e rola o seguinte diálogo.
- Fala Tunico. Como você foi de viagem na Paulicéia desvairada?
- Muito bem, poeta. Mas olha só. Tenho uma novidade pra você.
- Diga, Tunico.
- Poetinha! Você não faz idéia da brochada que você deu.





22Laura Corona, Newton Teixeira e outras 20 pessoas
1 comentário

Curtir




Comentar


Compartilhar

QAnon

Estava tocando num bar e quando se encerrou a função, conversei rapidamente com algumas pessoas e entre elas havia um sujeito que eu conhecia de vista.
Regulava de idade comigo e eu sabia que era irmão de um publicitário conhecido aqui de Porto Alegre.
O assunto foi por aí, por música e bossa nova, e o papo caminhou um pouco até parar na política e o cara veio com uma conversa de que haveria uns milionários judeus, gays, na Inglaterra e nos Estados Unidos que estavam fazendo um movimento mundial para desmoralizar a instituição família.
Helllôooou.
O cara foi me dizendo isso enquanto agarrava meu pulso. Cada frase, uma agarradinha, até meu pulso começar a arder legal. Acho detestável pessoas tocarem em você quando não há uma mínima intimidade.
Num determinado momento, me sentindo mareado, pedi licença e saí dali.
No dia seguinte, entrei no Face do cara e havia ali um bocado de fascismo e outro bocado de loucura. Essas duas cosa andam bem juntinhas.
Block.
Isso faz uns dois anos.
Lembrei deste fato ao ler uma matéria esta semana sobre o QAnon.
Caráleo!
O cara já era QAnon.

INSTRUÇÕES PARA O NOVO TRATAMENTO PRECOCE

Duas vezes ao dia vá para seu quarto e feche a porta.

Abra a latinha onde estão as medicações.

Retire primeiramente o comprimido de Invermectina e o deposite sobre a cama.

Mantenha contato visual com com ele durante trinta segundos e após isso deite de costas sobre o mesmo.

Depois de mais trinta segundos levante.

Segure novamente o comprimido. Talvez ele esteja aquecido e até mesmo molhado de suor.

Não dê atenção a tais detalhes e recoloque o comprimido na lata. É bom que você execute esta tarefa em completo silêncio, sem emitir queixumes e tampouco dirigir a palavra ao remédio, que geralmente é irritadiço, bem ao contrário do Rivotril, que mesmo sendo ofendido e ameaçado, jamais revida por se tratar de um remédio controlado.

Depois de guardar a Invermectina, retire a Cloroquina da latinha e flambe. Não muito. Cinco segundos já bastam. Deposite a pílula sobre sua mesa de cabeceira e se ajoelhe para orar.

Talvez esta incômoda posição lhe dê uma vontade de dar um pum. Não se contenha. Afinal de contas você fechou a porta do quarto foi pra isso mesmo. E também para que o resto dos habitantes da casa não descubra que você é abobado.

Termine sua oração.

Recoloque também este comprimido de volta na lata, exatamente ao lado da Invermectina e tape os dois com um cobertorzinho. Tampe a lata.

Pronto.

Está terminado o novo tratamento precoce diário pro covidão, muito melhor do que o tratamento tradicional que vai te intoxicar a caralha do pâncreas e aí sim os puns vao tornar a vida no bairro impossível. 

Além do mais, muito mais barato. 

Cada comprimido pode durar até um ano se não cair no chão, sair rolando e afundar no xixi de algum gato mal ensinado.

Este novo tratamento precoce contra a covid não pode ser feito depois da aplicação da vacina, pois no momento em que você vira jacaré fica impossibilitado de abrir latinhas e no fim da oração talvez também surja a dificuldade de fazer o sinal da cruz devido aos braços curtos.

Depois de tudo, entre nos posts dos esquerdopatas e prove pra esses mortadelas que quem faz o tratamento precoce não pega jamais o coronga. Utilize memes desaforados sem pena. Faça uso de seu direito de expressão.





36Magali Corona, King Jim e outras 34 pessoas
3 comentários

Curtir




Comentar


Compartilhar