sábado, 3 de outubro de 2015

ROMANCE DE FACEBOOK

Os dois tinham se conhecido rapidamente pela rede e ele logo convidou-a para sair. 

Ela gostou da atitude cheia de atitude da parte dele e aceitou o convite, não sem antes dar uma furungada nas fotos. 

Achou que ele não era nada de mais, mas também nada de menos. Tinha fotos normais, com amigos, com filhos e ela só encasquetou com uma, na qual ele estava ao lado da mãe. 

Cara de um, focinho do outro. 

Sempre desconfie deste fenômeno. Quando o filho é a cara da mãe, é sabido que ele é apenas um boneco. É a mesma pessoa em dois corpos diferentes, sendo que a personalidade é a da velha.

No momento em que estavam sentando no restaurante ela foi chamada à atenção pelo cabelo do sujeito. Nas fotos do Face não dava pra ter uma ideia mais precisa, mas com a iluminação farta daquele estabelecimento, ela pôde ver com clareza que era tipo uma moita, logo em seguida achou que se parecia mais com um carpete, até ter certeza de que aquilo era um fragmento removido de algum gramado sintético. Ficou como que hipnotizada e não conseguia tirar os olhos daquela formação que começava um pouco acima das sobrancelhas e ia quase até às costas.

O homem parecia ansioso, consultando toda hora o relógio, e subitamente num gesto decidido, com um sorriso enigmático na cara, tirou um tubinho de plástico do bolso do paletó e de dentro deste pescou um comprimido azul que depositou sobre a mesa ao lado do prato. A moça então não se conteve e apontando para a pílula celeste, mandou.

- Posso perguntar o que é isto?
- Claro, Elizabéss.
- Haroldo... você pode me chamar de Beth.
- Nome de rainha, Elizabéss...tem de ser respeitado. Esqueçamos minimizações. Você não gosta da minha pronúncia? Elizabésssss.

Ele tratou de exagerar a articulação da palavra, usando a língua bem entre os dentes. Com a performance, acabou aspergindo um pouco de saliva, atingindo levemente o rosto da moça que se sentindo um pouco mareada, voltou a perguntar.

- Isso é remédio. Haroldo?
- Não, Elizabéss. É Viagra.

Ela ficou atônita, em silêncio. Enquanto ele espiava o relógio mais uma vez. Beth voltou à carga.

- E você vai tomar este comprimido agora?
- Vou. Exatamente agora.

E engoliu o azulzinho com assustadora sofreguidão. Após verificar a hora mais uma vez, explicou.

- É o comprimido das 8, Elizabéss. Saiba que tomo Viagra de 8 em 8 horas.

Quando ela ouviu a resposta e observou aquele sorriso de Jack Nicholson nos seus piores momentos, murmurou com uma voz quase inaudível.

- Sério?
- Sério, Elizabéss. Assim estou sempre pronto pro que der e vier. Daí, de onde você agora está sentada, infelizmente, não pode admirar o magnífico resultado do meu tratamento.

Nesse momento ela começou a sentir uma vontadezinha de chorar. Ele continuou.

- E daí de onde você está sentada também não pode visualizar uma outra coisinha muito interessante... interessante de verdade, Elizabess. Pode acreditar.

Ela então indagou com um fiozinho de voz.

- É? E o que seria?

Depois de uma pequena pausa, Haroldo se inclinou sobre a mesa e, com uma careta sorridente, sussurrou: 

- Eu depilo.

Beth sentiu o calafrio que lhe percorria os ossos.

- Depila?

- Depilo, Elizabéss. Depilo as partes. Depilo tudinho. Até o botão do alarme tá depilado, você acredita?

Nesse instante, Beth se engasgou e já ia começar a tossir, mas Haroldo inclinou-se mais ainda, quase encostando o rosto no rosto da mulher, que agora estava pálida e de olhos arregalados. 

Em tom quase segredado o homem despejou lentamente.

- Elizabéss... Agora eu estava reparando...que olho lindo que você tem, um olho azul... grande. Sabe que tenho um sonho?...ter um olho assim, exatamente assim, como o seu, pra por no meu chaveiro... já pensou? Você não acha que ficaria joia?


Ao ouvir isto, Beth não pode evitar uma primeira lágrima, mas antes que caísse a segunda, deu um grito, levantou-se com escândalo e iniciou ensandecida carreira pelo restaurante, desafiando todas as leis dos saltos altos, e como uma garça desesperada que necessita urgentemente alçar voo, depois de quase fazer um strike de garçons, mergulhou pra dentro de um táxi em movimento.


Quinze minutos depois, Beth chegou em casa, fechou portas e janelas, encerrou a conta do Face, mudou de e-mail, pediu férias e foi passar 15 dias na casa da irmã Margareth. Quero dizer...Margaréss.


FC - OUTUBRO - 15 - pOa

Nenhum comentário:

Postar um comentário