Me lembrou de quando recém havia chegado ao Rio de Janeiro e numa noite, no momento em que entrei no Rival, Djavan estava no palco acompanhado por um músico apenas. Acho que era o lançamento do Songbook de João Bosco e a canção era lenta. Fui pro fundo do teatro e fiquei de pé, observando a performance. Pensei.
Putz. É como se fosse um anjo cantando.
Conheci um carioca chamado Jaburu, que além de ser um grande compositor, tinha uma inteligência daquelas que tornava importante fazer-se silêncio pra ouvir o que ele tinha a dizer sobre música. Jaburu, certa feita, num boteco, sentenciou que nunca se deve imitar Djavan cantando porque é algo que a gente vicia e nunca mais deixa. Tem muita beleza em sua forma de cantar.
Verdade verdadeira.
Aqui pelo sul Djavan não chegava. Muito melancólico, era o que se falava por estas bandas.
Os publicitários odiavam. Por esta melancolia, Djavan não seria referência pra nada em propaganda, mesmo que se diga por aí que melancolia nada mais é do que a felicidade de estar triste. Eu curto muito uma melancoliazinha, mas sei que melancolia não vende jeans e muito menos detergente.
Mas num belo dia, Djavan fez uma canção e introduziu nela a seguinte frase; “Te devoraria como a Leonardo de Caprio”.
E os astros fizeram seu trabalho.
“Titanic” foi lançado na mesma época e jogou Leonardo às nuvens. A canção de Djavan pegou carona neste trem. Esta é uma teoria minha e só minha.
O que sei é que a partir deste momento ”Te devoro” passou a ser a música mais tocada na noite porto alegrense e lembro que foi surpreendente entrar na casa de um amigo e ouvir as melancolias alagoanas de Djavan. Sua filha, que estava com quinze, havia comprado o CD.
Nessa época era Djavan por todo canto que chegou a encher.
Um tempo depois ele fez um show no Araújo Viana lotado e nas primeiras filas só menininhas de quinze anos. Apaixonadas pelo cara.
Djavan, numa entrevista, disse que sua carreira tinha tomado um rumo que ele não estava gostando muito.
Era muito sucesso, acho.
Mas foi uma boa conjunção astral que o tornou mais popular ainda. Anos antes, sua trajetória já havia dado um bom salto com o disco Luz, onde Samurai foi o carro chefe, mas o "eu te devoro" jogou o cara pras estrelas.
É sempre bom quando a cultura se propaga, mesmo quando ajudada por um golpe de sorte.
Neste momento estamos necessitando de muitos golpes de sorte, pois se antes o poder não se importava muito com a cultura, agora o poder deseja aniquilá-la.
Djavan é necessidade vital brasileira.
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