quinta-feira, 18 de agosto de 2016

LOCKS DE TODA ESPÉCIE


Quando a noite avança e fico sem cigarros só me resta caminhar 3 ou 4 quadras até o Largo do Machado, onde tem uma banca que não fecha. Não gosto muito de fazer isto, pois o cara que ali atende demonstra um ódio por mim que deve ser de outra vida.

A cena se repete sempre. Dou um “boa noite” e a resposta é o silêncio acompanhado de um olhar que me fuzila.

– Me dê um Derby Prata, por favor.

– Senhor?

Ele nunca capta a primeira mensagem e suas reações são sempre rápidas e impacientes. Quando consegue entender o pedido ele pega o maço e o deposita no balcão com força exagerada.

Eu pago, ele coloca o dinheiro na caixa com força igual e se houver troco e for moeda ele as coloca no balcão com um tapa ruidoso. E me olha firme. A raiva escorre.

Ainda vou descobrir o porquê desta fúria. Me despeço sem ter resposta, é claro, e saio aliviado fumando meu cigarrinho porque a vida é boa. A minha, certamente. Lock ness total. Mas o Catete é assim. Tem uma fauna humana variadíssima. Locks de toda espécie.

Tem também um magrão, figuríssima, que anda pra lá e pra cá com uma garrafa térmica na mão. Sabem o que ele faz? Serve cafezinho a todos os camelôs e ambulantes da região. 50 centavos cada café. Certamente ganha muitíssimo mais do que eu. É jovem, alto, tem um cabelo inexplicavelmente caju em forma de capacete e agora tem levado um violão nas costas que acho que é só pra enganar. Cruzo com ele toda hora. Tá sempre de preto, muito ereto e determinado. O olhar no vazio. Lock ness daqueles de atar. Ou não.

Mas o que queria contar é cena de outro bairro. Dia destes saí com uns colegas do trabalho pra tomar um chope. O local seria o Bar da Lagoa, e fiquei sabendo no trajeto que este restaurante é famosíssimo pelo mau atendimento. Fiquei bem curioso.

Não há coisa que me deixe mais irritado do que mau atendimento e eu gosto muito de ficar irritado. Tenho uma amiga que diz que gosta de ler O Globo só pra ficar irritada. Ela também aprecia uma irritaçãozinha.

Mas voltando ao assunto, chegamos ao bar eram umas 8 da noite e o bar estava lotado. Apesar disto, conseguimos uma boa mesa num local arejado.

Meia hora e 2 ou 3 chopes depois eu não tinha notado nada de diferente. O atendimento não era pior do que qualquer outro bar do Rio de Janeiro. Fiquei desapontado e chamei o cara que parecia ser o encarregado. Ele se aproximou e lhe perguntei o nome. Carlos.

– Seu Carlos, é a primeira vez que venho a este bar e devo dizer que fui atraído até aqui pela fama do péssimo atendimento.

Ele ficou me olhando interrogativo. Segui falando.

– Quando cheguei fui cumprimentado por aquele garçom baixinho. Aquele outro, mais velhinho, pisou no meu pé e pediu desculpas e os chopes não demoram nadinha.

Ele continuou ouvindo, tranquilo. Prossegui então.

– Seu Carlos. Acho que não volto mais a seu estabelecimento. Devo dizer pro senhor que o mau atendimento de vocês não está nada bom.

Seu Carlos ficou me olhando com uma cara de cachorro que lambeu graxa, certamente pensando que eu era só mais um lock ness entre tantos outros que navegam por esta cidade ensandecida.




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