- Alô!
- Que balaço, hein Marilu?
- Quem fala?
- Ora, quem fala! Sou eu, Marilu. Wanderley.
- Ah... oi, querido.
- E aí? Muita ressaca?
- Que é isso? Nada. Acordei cedo e já fiz um monte de coisas.
- Acredito....
- Você nem sabe. Ontem peguei um Uber e paguei só dois reais.
- Eu sei sim, Marilu. Você não descansou enquanto não aceitei teus dois reais.
- Como assim?
- Tás louca, Marilu?! Fui eu quem te levou em casa. Chapada total. Queria pagar a corrida. Falou todo tempo que meu carro era do Uber.
- Tá de brincadeira!?
- Tô não, querida. Numa hora saltou pro banco de trás, pedindo balinha e de repente abriu a janela e começou a gritar Fora Temer feito uma doida.
- Putz. Sério?
- Sério. Dali a pouco parou, ficou aquele silêncio no ar e quando olho pelo retrovisor você tá pelada. Tive de entrar numa rua deserta e foi o maior custo fazer você se vestir de novo.
- Ai, Wandeco, que vergonha, mas escuta uma coisa.
- Fala.
- A gente transou?
- Claro que não, Marilu. Você tava loucassa. Além do mais parecia um fogão a lenha, de tanto cheiro de cigarro.
- Mas eu não fumo, Wanderley.
- Pra você ver.
- Wandeco.
- Que?
- Puta dor de cabeça, viu?
- Ué. Você não disse que tava bem?
- Mentira, querido. Tô na cama com um balde do lado. Acabei de vomitar uma amídala.
- Putz. Imaginei que você ia se ferrar. Por sorte não te levei pra comer aquele xis coração que você tava pedindo.
- Xis coração!?
- Foi. Acho que teria sido pior.
- Que nojo!!! Aaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh
Wanderley escutou com clareza Marilu botando as tripas pra fora. Desligou o telefone adivinhando que a outra amídala também já era, e pensando o quão perigosos podem ser os balaços ao final de um ano que se apresentou tão sacana.
quinta-feira, 29 de dezembro de 2016
terça-feira, 20 de dezembro de 2016
CHAT 2
Faz muito, MUITO, MUITO, MUITO, MUITO tempo, num chat, ela escreveu:
CADÊ VC? VC SUMIL!!!
Fiquei olhando praquilo sem saber o que fazer. Quando achei a resposta lógica, digitei.
TOMEI DORIU
E fiquei pensando.
PUTA QUE PARIL.
Ela então replicou.
SABE O QUE É? EU TAVA COM SALDADE.
Então refleti.
ACHO QUE TÔ DE MAUDADE. A MOÇA TEM UM CORAÇÃO BONITO.
Escrevi.
TÁ PASSANDO UM FÍUME BACANA NOS CINEMAS. VAMOS?
A resposta não tardou.
UM FÍUME DESTES QUE TEM BEJO NO FINAU?
Mandei de volta.
BEJO NO FINAU, BEJO NO MEIO, BEJO NO COMEÇO.
Ela pareceu gostar.
ASSIM VOU FICAR CHEIA DE DESEIJO.
Fiquei animado.
DEPOIS PODEMOS COMER UM PÃO DE QUEJO.
Ela adorou.
COM CERVEIJA?
Eu dei uma opção.
QUE SEIJA, OU COM ALGUM VINHO LEGAU.
Ela mandou junto com uma figurinha:
LEGAU É VOCÊ QUE É GENTIU.
Então resolvi perguntar.
NÃO ME LEVA A MAU, MAS DE QUE CIDADE MESMO VC TECLA?
Ela demorou mas respondeu.
DE BLUMENAL
Me desgostei. Então teclei.
BAH, ACHO QUE NÃO VAI DAR. SOU DE SÃO GABRIÉU
Ela respondeu assim.
NOSSO ROMANCE NÃO PODE TER ESTE TRISTE FINAU E IR ASSIM PRO BELELEL. VC NÃO TEM AUTOMÓVEU?
Comuniquei então com a certeza de causar frisson.
TENHO UM DIRIGÍVEU. QUE TAU?
Ela se alegrou.
QUE LINDO. ENTÃO PASSA AQUI NA SEXTA QUE NA SEXTA TÔ DISPONÍVEU.
Digitei então com dedos apaixonados.
VOU TE LEVAR PRA CONHECER O VERDADEIRO CÉL.
Ela se desmanchou.
NO ESPAÇO SIDERAU?
Inspirado, devolvi.
ATÉ A AURORA BOREAU QUE CERTAMENTE É ALGO QUE VC NUNCA VIL.
Senti que com essa ela se emocionou.
PUXA. VC É INCRÍVEU. TE ESPERO NA SEXTA ENTÃO;
Eu.
LEGAU.
Ela.
VOCÊ VAI VIM MESMO?
Eu.
CLARO QUE VOU IM.
Ela.
MIU BEJOS PRA VC ENTÃO.
Eu.
MIU BEJOS PRA VOCÊ TAMBÉM.
Ela.
TAMBÉN NÃO É COM N NO FIN?
Eu.
SABE QUE NÃO SEIL?.
CADÊ VC? VC SUMIL!!!
Fiquei olhando praquilo sem saber o que fazer. Quando achei a resposta lógica, digitei.
TOMEI DORIU
E fiquei pensando.
PUTA QUE PARIL.
Ela então replicou.
SABE O QUE É? EU TAVA COM SALDADE.
Então refleti.
ACHO QUE TÔ DE MAUDADE. A MOÇA TEM UM CORAÇÃO BONITO.
Escrevi.
TÁ PASSANDO UM FÍUME BACANA NOS CINEMAS. VAMOS?
A resposta não tardou.
UM FÍUME DESTES QUE TEM BEJO NO FINAU?
Mandei de volta.
BEJO NO FINAU, BEJO NO MEIO, BEJO NO COMEÇO.
Ela pareceu gostar.
ASSIM VOU FICAR CHEIA DE DESEIJO.
Fiquei animado.
DEPOIS PODEMOS COMER UM PÃO DE QUEJO.
Ela adorou.
COM CERVEIJA?
Eu dei uma opção.
QUE SEIJA, OU COM ALGUM VINHO LEGAU.
Ela mandou junto com uma figurinha:
LEGAU É VOCÊ QUE É GENTIU.
Então resolvi perguntar.
NÃO ME LEVA A MAU, MAS DE QUE CIDADE MESMO VC TECLA?
Ela demorou mas respondeu.
DE BLUMENAL
Me desgostei. Então teclei.
BAH, ACHO QUE NÃO VAI DAR. SOU DE SÃO GABRIÉU
Ela respondeu assim.
NOSSO ROMANCE NÃO PODE TER ESTE TRISTE FINAU E IR ASSIM PRO BELELEL. VC NÃO TEM AUTOMÓVEU?
Comuniquei então com a certeza de causar frisson.
TENHO UM DIRIGÍVEU. QUE TAU?
Ela se alegrou.
QUE LINDO. ENTÃO PASSA AQUI NA SEXTA QUE NA SEXTA TÔ DISPONÍVEU.
Digitei então com dedos apaixonados.
VOU TE LEVAR PRA CONHECER O VERDADEIRO CÉL.
Ela se desmanchou.
NO ESPAÇO SIDERAU?
Inspirado, devolvi.
ATÉ A AURORA BOREAU QUE CERTAMENTE É ALGO QUE VC NUNCA VIL.
Senti que com essa ela se emocionou.
PUXA. VC É INCRÍVEU. TE ESPERO NA SEXTA ENTÃO;
Eu.
LEGAU.
Ela.
VOCÊ VAI VIM MESMO?
Eu.
CLARO QUE VOU IM.
Ela.
MIU BEJOS PRA VC ENTÃO.
Eu.
MIU BEJOS PRA VOCÊ TAMBÉM.
Ela.
TAMBÉN NÃO É COM N NO FIN?
Eu.
SABE QUE NÃO SEIL?.
SARAUS E COXINHAS
Tenho ido a alguns saraus literários. É bacana, embora pra mim seja bastante difícil assimilar o que é lido, recitado, contado. É diferente de assistir música, que a gente pode flutuar um pouco.
Nestes saraus, a atenção tem de ser total e atenção total é algo que não possuo jamais, ainda mais se beber um par de cervejas gordinhas. Mas sarau é legal.
Estes saraus aos quais tenho ido são frequentados apenasmente pelos FORATEMER. Não tem coxa nestes eventos.
Neste último que fui, no Ocidente, dei uma viajada e deixei de prestar atenção ao texto pra pensar um pouco sobre o seguinte:
Quando é que imaginaríamos que a sociedade iria se dividir a tal ponto de certos ambientes acabarem se tornando desaconselháveis pra certas pessoas? Isto me pareceu terrível, naquele momento. É como um sonho ruim.
Outra coisa que logo me veio também.
Será que os coxas fazem seus saraus? Um sarau onde não entra Chico, não entra Veríssimo, um sarau sem Galeano, sem Cortazar que são os autores condenados. Será que pode? Eles leriam o que? Olavo de Carvalho? Lobão? Trechos do livro da LavaJato? Talvez Paulo Coelho, mas Paulo Coelho também está contra o movimento coxa. Acho que ser coxa não deve ser muito divertido. Ou quem sabe em vida de coxa não entra sarau? Vai ser proibido sarau? Sarau é coisa de comunista? E música? Só vão escutar o que vem de compositores de direita? Existe isso? Compositores de direita? E bons?
Mas vamos pensando, vamos pensando, refletindo sobre estas coisas, e existe uma onda contra este ato de refletir, existe um movimento maluco contra o exercício do intelecto. O surgimento de uma gente assim, que condena o pensamento, é algo que é por demais surpreendente. Não é?
Então, os que teimamos em refletir, estamos um pouco tontos, buscando algumas explicações lógicas pra estes comportamentos pirados e ainda não sabemos direito o que pensar e o que dizer.
Dia destes tocamos no Fon Fon e foi legal pra caramba. Muito mesmo. As pessoas vieram nos cumprimentar no final e uma delas se aproximou de mim e disse ter gostado demais do concerto e de repente me perguntou;
- Mas não somos mais amigos no Face?
Então lembrei dela.
Respondi.
- Acho que te bloqueei. Te vi compartilhando material fascista.
- É. Eu sou coxinha. Mas não podemos nem ser amigos?
- Não.
Eu já havia, minutos atrás, conversado sobre política e tinha comentado que meu pai fora cassado no golpe de 64 e este assunto sempre me deixa uma brasa dançando no estômago e uma vontade de dar um soco em alguém. O papo seguiu assim:
- E não vou poder nem assistir a teus shows?
- Acho que estamos nos dirigindo a isso.
Ela foi se afastando, me fitando com um olhar de estranheza e se foi. Eu fiquei chateado. Mas as palavras foram me saindo desta forma quase impensada e tenho certeza que o diálogo foi exatamente da forma que conto.
Não sabemos direito o que pensar e o que dizer. Não sabemos como agir.
Mas vamos descobrindo o jeito certo, vamos entendendo.
Espero.
Nestes saraus, a atenção tem de ser total e atenção total é algo que não possuo jamais, ainda mais se beber um par de cervejas gordinhas. Mas sarau é legal.
Estes saraus aos quais tenho ido são frequentados apenasmente pelos FORATEMER. Não tem coxa nestes eventos.
Neste último que fui, no Ocidente, dei uma viajada e deixei de prestar atenção ao texto pra pensar um pouco sobre o seguinte:
Quando é que imaginaríamos que a sociedade iria se dividir a tal ponto de certos ambientes acabarem se tornando desaconselháveis pra certas pessoas? Isto me pareceu terrível, naquele momento. É como um sonho ruim.
Outra coisa que logo me veio também.
Será que os coxas fazem seus saraus? Um sarau onde não entra Chico, não entra Veríssimo, um sarau sem Galeano, sem Cortazar que são os autores condenados. Será que pode? Eles leriam o que? Olavo de Carvalho? Lobão? Trechos do livro da LavaJato? Talvez Paulo Coelho, mas Paulo Coelho também está contra o movimento coxa. Acho que ser coxa não deve ser muito divertido. Ou quem sabe em vida de coxa não entra sarau? Vai ser proibido sarau? Sarau é coisa de comunista? E música? Só vão escutar o que vem de compositores de direita? Existe isso? Compositores de direita? E bons?
Mas vamos pensando, vamos pensando, refletindo sobre estas coisas, e existe uma onda contra este ato de refletir, existe um movimento maluco contra o exercício do intelecto. O surgimento de uma gente assim, que condena o pensamento, é algo que é por demais surpreendente. Não é?
Então, os que teimamos em refletir, estamos um pouco tontos, buscando algumas explicações lógicas pra estes comportamentos pirados e ainda não sabemos direito o que pensar e o que dizer.
Dia destes tocamos no Fon Fon e foi legal pra caramba. Muito mesmo. As pessoas vieram nos cumprimentar no final e uma delas se aproximou de mim e disse ter gostado demais do concerto e de repente me perguntou;
- Mas não somos mais amigos no Face?
Então lembrei dela.
Respondi.
- Acho que te bloqueei. Te vi compartilhando material fascista.
- É. Eu sou coxinha. Mas não podemos nem ser amigos?
- Não.
Eu já havia, minutos atrás, conversado sobre política e tinha comentado que meu pai fora cassado no golpe de 64 e este assunto sempre me deixa uma brasa dançando no estômago e uma vontade de dar um soco em alguém. O papo seguiu assim:
- E não vou poder nem assistir a teus shows?
- Acho que estamos nos dirigindo a isso.
Ela foi se afastando, me fitando com um olhar de estranheza e se foi. Eu fiquei chateado. Mas as palavras foram me saindo desta forma quase impensada e tenho certeza que o diálogo foi exatamente da forma que conto.
Não sabemos direito o que pensar e o que dizer. Não sabemos como agir.
Mas vamos descobrindo o jeito certo, vamos entendendo.
Espero.
domingo, 18 de dezembro de 2016
NADA PRA FAZER – FALANDO DE FRUTAS
O mamão, pra mim, é a fruta número um. Você coloca na boca e já sente que ele faz bem, sente que tá limpando. Não é à toa que é uma das primeiras frutas que se dá pro nenê e daí existe um outro lado engraçado também. Quem limpou muita bunda de criança até relaciona. Minha ex dizia que o mamão é o cocô em forma de fruta.
Quando vivi na Espanha me deliciava com os melões. Cada melão era uma surpresa diferente. Tinham variados gostos que lembravam até outras frutas. O melão, assim como a melancia, é divino. Só tem um porém. Às vezes causam uns gases que te atacam nas costas e até a língua fica dura. Dói pra caramba e parece que vai rolar um infarto.
Sobre a manga já falei. É comendo uma manga na pia que a gente sente a presença do Senhor. É muito êxtase. O grilo da manga é que caga a roupa toda e mancha. Jô Soares diz que manga, a gente deve comer no banho.
A laranja é a rainha das frutas. Quando ela tá boa, dá um prazer imenso e o suco é disparado o melhor de todos. Só que dá muita mão de obra pra fazer. Quem prepara suco de laranja pra outra pessoa e não cobra por isto, é porque ama muito este ente.
As bergamotas e afins são parente pobres da laranja, mas são populares pra caramba. Mexem com nossa nostalgia, nos mandam ser criança de novo. Meu pai só comia se descascassem pra ele. Não queria ficar com o cheiro delas nas mãos. A casca da berga é super perfumada. Meu pai me ensinou a espremer a casca perto da cara dos outros. O efeito é parecido ao do gás lacrimogêneo. Me ensinou também a espremer em direção à chama de um fósforo. Rola uns mini fogos de artifício.
O limão é outro primo pobre. Limão é mal-humorado e só os mais doidões comem ou bebem o suco pra curar doenças alérgicas. É remédio milagroso, dizem. Eu derramo suco na Coca e às vezes fica uma das maravilhas do mundo. Houve um tempo em que eu comia a casca do limão siciliano.
O abacaxi tem aquela carapaça que parece coisa da pré-história. Você bota ele no saco do super, sai caminhando e ele vai fincando nas canelas até você pegar tétano. É chato pra descascar. Quando tá no ponto é uma loucura, mas muitas vezes tá ácido, você come com muita careta e depois nascem umas aftas maiores que a língua. Lembro que teve uma dieta da moda chamada dieta do abacaxi. Coitadas das pessoas que embarcaram nessa.
A banana, a fruta mais popular de todas, não posso comer. Se comer, morro. E nhaca de pobre é comer uma banana esmagada com canela. Nhaca maior que essa, só pão com manteiga e açúcar por cima. A primeira piada que ouvi,foi minha mãe que contou, e o assunto era a banana.
Um cara repara que o amigo está amarelo, parece mareado e lhe pergunta o que aconteceu.
- Putz. Comi muita banana e tô passando muito mal.
- Por que não coloca o dedo na garganta e vomita?
- Se tivesse lugar pro dedo eu comia mais uma banana.
A maçã. Comer maçã é algo como ir na missa. Poucas emoções. Se está seca, então é uma bosta, mas é boa pra criança e pra quem tá mal da barriga. Dizem os ingleses que: Uma maçã por dia e não verás a cara do médico.
A uva é dos deuses, não é? A que eu mais gosto, infelizmente, é a Dedo de Dama. Caríssima. Então, toda vez que vou no super, roubo 4 ou 5 grãos, com todo cuidado pra não ser pego. Já comi um parreiral inteiro às custas do Zaffari.
O morango mexe mais com o imaginário do que é gostoso. Se mistura muito bem com natas, cremes e sorvetes pra deixar a gente bem gordão, mas sozinho geralmente não tem muito gosto. Tenho uma vaga lembrança de ter comido quando criança uns morangos diferentes, menores, meio desmanchados que eram muito doces. Assim como o maracujá. Lembro de ter provado um maracujá que era um néctar, muito diferente destes que só servem pra fazer suco.
Pêssegos, ameixas e parentes. Sei lá o que aconteceu. Na minha infância eu era fã. Não sei ao certo, mas tenho a impressão de que carregam mais veneno do que as outras frutas. Desconfio.
O caqui, que aqui no sul chamamos cáqui, é uma loucura. Um amigo relaciona esta fruta com o órgão sexual feminino. Eu não gosto de misturar comidas com comidas, mas sempre que como um caqui, lembro desta parada. O contrário nunca aconteceu, até hoje pelo menos. Putz. Será que vou ficar sugestionado? Talvez alguém que leia isto fique marcado para todo o sempre. Agora já era. Já falei.
O Kiwi foi uma brincadeirinha do Senhor. Uma surpresinha. O Kinder Ovo da natureza. Quando é que você vai imaginar que aquela batata por fora pode ser aquela polpa de um verde fantástico por dentro?
O coco é outra criação pirada da natureza. No Rio de Janeiro deve estar caro pra caramba tomar uma água de coco no calçadão. Você compra, torce pra que tenha bastante, torce para que esteja doce e torce pra que esteja gelada. Se não rola, você tá mais pobre e ainda com sede. No Rio descobri que quem gosta mais de coco é cachorro. Eles ficam bem loucos. Comem toda a polpa.
Jaca? Só vi e fiquei com nojo. Fedorenta e gigantesca. Não me atrevi a provar.
Lichia. Uma das portas ao paraíso.
Atemoia. Impressionante. Pode estar com aspecto melhor ou pior, tem sempre o mesmo gosto formidável. Difícil encontrar uma atemoia ruim.
Pra finalizar, uma salva de palmas pro tomate que é um companheiro desde sempre. Estes pequenos que estão cada vez mais nas prateleiras têm um jeito ainda mais frutuoso. Além de tudo, dizem que o tomate faz muito bem pra próstata. Dizem também que faz mal pro rim. Quer saber? Dane-se o rim.
Quando vivi na Espanha me deliciava com os melões. Cada melão era uma surpresa diferente. Tinham variados gostos que lembravam até outras frutas. O melão, assim como a melancia, é divino. Só tem um porém. Às vezes causam uns gases que te atacam nas costas e até a língua fica dura. Dói pra caramba e parece que vai rolar um infarto.
Sobre a manga já falei. É comendo uma manga na pia que a gente sente a presença do Senhor. É muito êxtase. O grilo da manga é que caga a roupa toda e mancha. Jô Soares diz que manga, a gente deve comer no banho.
A laranja é a rainha das frutas. Quando ela tá boa, dá um prazer imenso e o suco é disparado o melhor de todos. Só que dá muita mão de obra pra fazer. Quem prepara suco de laranja pra outra pessoa e não cobra por isto, é porque ama muito este ente.
As bergamotas e afins são parente pobres da laranja, mas são populares pra caramba. Mexem com nossa nostalgia, nos mandam ser criança de novo. Meu pai só comia se descascassem pra ele. Não queria ficar com o cheiro delas nas mãos. A casca da berga é super perfumada. Meu pai me ensinou a espremer a casca perto da cara dos outros. O efeito é parecido ao do gás lacrimogêneo. Me ensinou também a espremer em direção à chama de um fósforo. Rola uns mini fogos de artifício.
O limão é outro primo pobre. Limão é mal-humorado e só os mais doidões comem ou bebem o suco pra curar doenças alérgicas. É remédio milagroso, dizem. Eu derramo suco na Coca e às vezes fica uma das maravilhas do mundo. Houve um tempo em que eu comia a casca do limão siciliano.
O abacaxi tem aquela carapaça que parece coisa da pré-história. Você bota ele no saco do super, sai caminhando e ele vai fincando nas canelas até você pegar tétano. É chato pra descascar. Quando tá no ponto é uma loucura, mas muitas vezes tá ácido, você come com muita careta e depois nascem umas aftas maiores que a língua. Lembro que teve uma dieta da moda chamada dieta do abacaxi. Coitadas das pessoas que embarcaram nessa.
A banana, a fruta mais popular de todas, não posso comer. Se comer, morro. E nhaca de pobre é comer uma banana esmagada com canela. Nhaca maior que essa, só pão com manteiga e açúcar por cima. A primeira piada que ouvi,foi minha mãe que contou, e o assunto era a banana.
Um cara repara que o amigo está amarelo, parece mareado e lhe pergunta o que aconteceu.
- Putz. Comi muita banana e tô passando muito mal.
- Por que não coloca o dedo na garganta e vomita?
- Se tivesse lugar pro dedo eu comia mais uma banana.
A maçã. Comer maçã é algo como ir na missa. Poucas emoções. Se está seca, então é uma bosta, mas é boa pra criança e pra quem tá mal da barriga. Dizem os ingleses que: Uma maçã por dia e não verás a cara do médico.
A uva é dos deuses, não é? A que eu mais gosto, infelizmente, é a Dedo de Dama. Caríssima. Então, toda vez que vou no super, roubo 4 ou 5 grãos, com todo cuidado pra não ser pego. Já comi um parreiral inteiro às custas do Zaffari.
O morango mexe mais com o imaginário do que é gostoso. Se mistura muito bem com natas, cremes e sorvetes pra deixar a gente bem gordão, mas sozinho geralmente não tem muito gosto. Tenho uma vaga lembrança de ter comido quando criança uns morangos diferentes, menores, meio desmanchados que eram muito doces. Assim como o maracujá. Lembro de ter provado um maracujá que era um néctar, muito diferente destes que só servem pra fazer suco.
Pêssegos, ameixas e parentes. Sei lá o que aconteceu. Na minha infância eu era fã. Não sei ao certo, mas tenho a impressão de que carregam mais veneno do que as outras frutas. Desconfio.
O caqui, que aqui no sul chamamos cáqui, é uma loucura. Um amigo relaciona esta fruta com o órgão sexual feminino. Eu não gosto de misturar comidas com comidas, mas sempre que como um caqui, lembro desta parada. O contrário nunca aconteceu, até hoje pelo menos. Putz. Será que vou ficar sugestionado? Talvez alguém que leia isto fique marcado para todo o sempre. Agora já era. Já falei.
O Kiwi foi uma brincadeirinha do Senhor. Uma surpresinha. O Kinder Ovo da natureza. Quando é que você vai imaginar que aquela batata por fora pode ser aquela polpa de um verde fantástico por dentro?
O coco é outra criação pirada da natureza. No Rio de Janeiro deve estar caro pra caramba tomar uma água de coco no calçadão. Você compra, torce pra que tenha bastante, torce para que esteja doce e torce pra que esteja gelada. Se não rola, você tá mais pobre e ainda com sede. No Rio descobri que quem gosta mais de coco é cachorro. Eles ficam bem loucos. Comem toda a polpa.
Jaca? Só vi e fiquei com nojo. Fedorenta e gigantesca. Não me atrevi a provar.
Lichia. Uma das portas ao paraíso.
Atemoia. Impressionante. Pode estar com aspecto melhor ou pior, tem sempre o mesmo gosto formidável. Difícil encontrar uma atemoia ruim.
Pra finalizar, uma salva de palmas pro tomate que é um companheiro desde sempre. Estes pequenos que estão cada vez mais nas prateleiras têm um jeito ainda mais frutuoso. Além de tudo, dizem que o tomate faz muito bem pra próstata. Dizem também que faz mal pro rim. Quer saber? Dane-se o rim.
sexta-feira, 16 de dezembro de 2016
O JOTA E O SEXO VIRTUAL
Estou eu de boas em casa, assistindo TV, são duas da manhã quando de repente toca a campainha. Pelo olho mágico vejo a lata do Jota com aquela conhecida careta que parece o sorriso de uma caveira e apenas isto já é o bastante para eu saber que o cara está nervoso e que algo saiu fora de ordem.
- Fala, Jota.
- E aí mestre? Dá uma chegada comigo no meu apê?
- Putz. Problemas?
- É.
Jota e eu somos vizinhos. Moramos num prédio situado em um bairro folclórico da cidade. Nem periferia, nem finesse e muito antes pelo contrário.
Vou fazendo algumas perguntas enquanto vencemos os degraus, mas como resposta obtenho apenas alguns vagos murmúrios ofegantes causados pelo esforço da subida. Depois de girar com mãos trêmulas a chave na fechadura, meu amigo me conduz até o centro da sala e abre a tela do PC. Surge ali, então, uma imagem de web cam, onde há uma mulher seminua, de corpo miúdo. Seus olhos parecem fechados e seu rosto está virado pra cima. A boca, aberta.
Com ares de desamparo, Jota indaga.
- E aí?
- Aí o que?
- O que te parece?
- Parece um pigmeu.
- Porra, não to querendo saber se você achou gostosa.
- Quer saber o que então?
- Tá morta?
- Como assim?
- Você acha que tá morta?
Coloco os óculos e me aproximo pra enxergar com mais precisão. Não há movimento nenhum naquela cena. Jota puxa mais uma cadeira para sentarmos, mas continuamos ali de pé, inclinados e ansiosos.
- Caralho, véio! O quê que tu aprontou, Jota?
- Virtual, irmão.
- Que?
- Sexo virtual.
- Normal, pô. Sexo virtual é sadio.
- Eu também achava.
- Que idade ela tem?
- Setentinha.
Carácoles. O Jota sempre mente a idade das minas. Diminui 10 anos, no mínimo.
- Putz. Muita pressão? Que diabo você mostrou pra ela?
- Eu não mostro, man. Eu falo. Você tá ligado que tenho minhas técnicas. Fui mexendo com as culpas dela, brother, dizendo que ela era uma menina má, que necessitava de castigo por não ter se comportado bem, falei tudo isso com voz de criança, falei que ia maltratar legal, e ela pareceu surpresa e ao mesmo tempo encantada e foi ficando doida e depois fui enumerando os parentes dela que eu iria traçar e comecei pelas irmãs e ela foi se possuindo, véio....
Acho detestável quando meu amigo começa a solar com sua voz monocromática e lenta. Dá uma sensação de que você vai ficar preso no tempo. É uma coisa muito enjoada.
- ...daí então quando o assunto chegou na mãe dela, ela começou a gritar, mestre, coisa linda de se ver, veio um orgasmão sei lá de onde, uma onda brutal, uma puta gritaria que foi passando, passando, foi diminuindo, e de repente ela ficou assim, uma estatuazinha, nesta mesma posição que você tá vendo agora.
- Não foi orgasmão bro, foi infartão.
- Primeiro orgasmão, né meu? Depois sim, infartão.
- Tá. Que seja. Parius, velho. Tu é escroto.
- O universo é escroto, mano. Eu sou apenas fruto.
Esta é uma resposta que o cara adora usar. Ele segue contando.
- Daí, como vi que ela tava tomando uns gorós, pensei que tinha pego no sono, e comecei a chamar ela. Fiz psiu, chamei pelo nome, daí comecei a gritar, então cantei, botei música, salsa, lambada, funk da porra, assoviei pra caralho, até que o vizinho subiu e veio aqui pra me encher de osso, ameaçando que ia me dar porrada e tudo, daí tive de parar. Logo veio a fome, man, e dei uma descida pra mandar um xis básico e quando voltei, ela continuava aí na mesmíssima posição. Daí foi batendo o grilo e resolvi te chamar. Será que matei a mina, meu?
Conheço o Jota faz vinte anos. É seu hábito diário devorar um xis coração. Sempre acompanhado de Fanta uva, que pode estar quente, pode estar sem gás, pode ter sido aberta na semana passada, não dá nada, ele bota pra dentro. Meu amigo é destes caras que estão sempre com o peito estufado, dando mini arrotos e certamente por isso, a maresia que se sente em sua volta remete ao asqueroso refri.
Nesse momento, reparo que ao fundo da imagem passa um gato preto.
- Óh. Tua véia tem um gatinho.
- Não é véia, irmão. E o gato não é dela. É do vizinho. Ela tem o maior grilo com ele. Conta que o gato invade o apê e se queixa de que ele vem pra assombrar ela no meio da noite. Diz que traz mau agouro e que já pensou até em envenenar o bicho.
- Putz. Esse gato vai comer ela.
- Caracas. Depois sou eu o pervertido.
- Porra, Jota. Não é comer de sexo. Ele vai comer ela é de deglutir mesmo.
- Sério? Carnes putrefatas?
- É.
- E fétidas?
- Isso mesmo.
- E nós podemos assistir?
- Se a rede não cair.
- Massa.
- Que massa, Jota? Caralho, bicho! Escrotidão total a tua!
- Não, que é isso.... me impressionei também, mano... o xis até meio que voltou.
- Hum.
- Mas igual... é massa.
Reparei que ele estava mastigando algo e imaginei que sim, que poderia ser um coração recuperado, e este fato me deixou bastante mareado. Então falei o que me veio à mente.
- Véio. Tenho uma ideia.
- Fala, Bro.
- Este gato é nossa chance. Se conseguirmos fazer com que ele suba nela, ela talvez desperte.
- Se ela não desencarnou, né? Até pode ser. Mas tô achando que ela já deve estar conversando com o Senhor.
- Tu sabe chamar gato?
- Claro que não, parceiro. Tá me estranhando?
O Jota é o tipo de cara que não sabe nada a respeito de gatos, cachorros, crianças. Pra ele, estes são seres inferiores que apenas atrapalham. Então comecei a chamar o animal.
- Pssss, pssss, psss, psss, pssss.....psss, pssss...
Logo arrisquei alguns miados. Jota me seguiu, copiando meus gestos, me obsevando com desconfiada atenção, o que tornou a cena mais ridícula ainda. Depois de alguns minutos destas churumelas, pra nossa surpresa, o gato surge em cena. O bichano sobe na mesa e está ali na nossa cara, nos fitando com olhos perversos, nos filmando, curioso, e com um discreto aceno de mão, peço a Jota que não emita nenhum som, para que se faça o silêncio absoluto tão necessário pra eu ganhar tempo e pensar em algo e é aí então que minha intuição brilha, e não tenho dúvidas, é automático, coloco as mãos em megafone e solto-lhe o mais poderoso latido de um legítimo cão pastor que sei tão bem imitar, e isto faz o bichano emitir um berro horripilante e logo dar pelos ares um duplo mortal carpado, caindo no colo da madame, cara a cara, unhas cravadas nas coxas, o que faz a moça imediatamente arregalar os olhos e por sua vez soltar seu berro insano na cara do animal histérico e num ato de fuga desesperada, numa perda absoluta de equilíbrio e sanidade, vai mulher pra um lado, gato pra outro, num verdadeiro caos de ruídos indecifráveis e os dois desaparecem completamente de nossas vistas.
Neste momento a rede cai e assombrado noto que meu amigo e eu, depois do meteórico e aterrorizante desenlace, como resultado, estamos de joelhos, quase abraçados e com as respirações descompassadas. Jota, ainda agarrado tenazmente a minhas mãos, corta o silêncio.
- Caraca, véio. A mina tá de boa.
- É. Tua véia não abriu vaga.
- Não é véia, bro.
- Tá bom, tá bom... parius... mas depois dessa, tô precisando beber alguma coisa urgente.
- Tem Fanta na cozinha, man.
- Fechada?
- Não. Mas é deste mês ainda.
- Escroto.
- O universo, bro, o universo que me fez..
- Fala, Jota.
- E aí mestre? Dá uma chegada comigo no meu apê?
- Putz. Problemas?
- É.
Jota e eu somos vizinhos. Moramos num prédio situado em um bairro folclórico da cidade. Nem periferia, nem finesse e muito antes pelo contrário.
Vou fazendo algumas perguntas enquanto vencemos os degraus, mas como resposta obtenho apenas alguns vagos murmúrios ofegantes causados pelo esforço da subida. Depois de girar com mãos trêmulas a chave na fechadura, meu amigo me conduz até o centro da sala e abre a tela do PC. Surge ali, então, uma imagem de web cam, onde há uma mulher seminua, de corpo miúdo. Seus olhos parecem fechados e seu rosto está virado pra cima. A boca, aberta.
Com ares de desamparo, Jota indaga.
- E aí?
- Aí o que?
- O que te parece?
- Parece um pigmeu.
- Porra, não to querendo saber se você achou gostosa.
- Quer saber o que então?
- Tá morta?
- Como assim?
- Você acha que tá morta?
Coloco os óculos e me aproximo pra enxergar com mais precisão. Não há movimento nenhum naquela cena. Jota puxa mais uma cadeira para sentarmos, mas continuamos ali de pé, inclinados e ansiosos.
- Caralho, véio! O quê que tu aprontou, Jota?
- Virtual, irmão.
- Que?
- Sexo virtual.
- Normal, pô. Sexo virtual é sadio.
- Eu também achava.
- Que idade ela tem?
- Setentinha.
Carácoles. O Jota sempre mente a idade das minas. Diminui 10 anos, no mínimo.
- Putz. Muita pressão? Que diabo você mostrou pra ela?
- Eu não mostro, man. Eu falo. Você tá ligado que tenho minhas técnicas. Fui mexendo com as culpas dela, brother, dizendo que ela era uma menina má, que necessitava de castigo por não ter se comportado bem, falei tudo isso com voz de criança, falei que ia maltratar legal, e ela pareceu surpresa e ao mesmo tempo encantada e foi ficando doida e depois fui enumerando os parentes dela que eu iria traçar e comecei pelas irmãs e ela foi se possuindo, véio....
Acho detestável quando meu amigo começa a solar com sua voz monocromática e lenta. Dá uma sensação de que você vai ficar preso no tempo. É uma coisa muito enjoada.
- ...daí então quando o assunto chegou na mãe dela, ela começou a gritar, mestre, coisa linda de se ver, veio um orgasmão sei lá de onde, uma onda brutal, uma puta gritaria que foi passando, passando, foi diminuindo, e de repente ela ficou assim, uma estatuazinha, nesta mesma posição que você tá vendo agora.
- Não foi orgasmão bro, foi infartão.
- Primeiro orgasmão, né meu? Depois sim, infartão.
- Tá. Que seja. Parius, velho. Tu é escroto.
- O universo é escroto, mano. Eu sou apenas fruto.
Esta é uma resposta que o cara adora usar. Ele segue contando.
- Daí, como vi que ela tava tomando uns gorós, pensei que tinha pego no sono, e comecei a chamar ela. Fiz psiu, chamei pelo nome, daí comecei a gritar, então cantei, botei música, salsa, lambada, funk da porra, assoviei pra caralho, até que o vizinho subiu e veio aqui pra me encher de osso, ameaçando que ia me dar porrada e tudo, daí tive de parar. Logo veio a fome, man, e dei uma descida pra mandar um xis básico e quando voltei, ela continuava aí na mesmíssima posição. Daí foi batendo o grilo e resolvi te chamar. Será que matei a mina, meu?
Conheço o Jota faz vinte anos. É seu hábito diário devorar um xis coração. Sempre acompanhado de Fanta uva, que pode estar quente, pode estar sem gás, pode ter sido aberta na semana passada, não dá nada, ele bota pra dentro. Meu amigo é destes caras que estão sempre com o peito estufado, dando mini arrotos e certamente por isso, a maresia que se sente em sua volta remete ao asqueroso refri.
Nesse momento, reparo que ao fundo da imagem passa um gato preto.
- Óh. Tua véia tem um gatinho.
- Não é véia, irmão. E o gato não é dela. É do vizinho. Ela tem o maior grilo com ele. Conta que o gato invade o apê e se queixa de que ele vem pra assombrar ela no meio da noite. Diz que traz mau agouro e que já pensou até em envenenar o bicho.
- Putz. Esse gato vai comer ela.
- Caracas. Depois sou eu o pervertido.
- Porra, Jota. Não é comer de sexo. Ele vai comer ela é de deglutir mesmo.
- Sério? Carnes putrefatas?
- É.
- E fétidas?
- Isso mesmo.
- E nós podemos assistir?
- Se a rede não cair.
- Massa.
- Que massa, Jota? Caralho, bicho! Escrotidão total a tua!
- Não, que é isso.... me impressionei também, mano... o xis até meio que voltou.
- Hum.
- Mas igual... é massa.
Reparei que ele estava mastigando algo e imaginei que sim, que poderia ser um coração recuperado, e este fato me deixou bastante mareado. Então falei o que me veio à mente.
- Véio. Tenho uma ideia.
- Fala, Bro.
- Este gato é nossa chance. Se conseguirmos fazer com que ele suba nela, ela talvez desperte.
- Se ela não desencarnou, né? Até pode ser. Mas tô achando que ela já deve estar conversando com o Senhor.
- Tu sabe chamar gato?
- Claro que não, parceiro. Tá me estranhando?
O Jota é o tipo de cara que não sabe nada a respeito de gatos, cachorros, crianças. Pra ele, estes são seres inferiores que apenas atrapalham. Então comecei a chamar o animal.
- Pssss, pssss, psss, psss, pssss.....psss, pssss...
Logo arrisquei alguns miados. Jota me seguiu, copiando meus gestos, me obsevando com desconfiada atenção, o que tornou a cena mais ridícula ainda. Depois de alguns minutos destas churumelas, pra nossa surpresa, o gato surge em cena. O bichano sobe na mesa e está ali na nossa cara, nos fitando com olhos perversos, nos filmando, curioso, e com um discreto aceno de mão, peço a Jota que não emita nenhum som, para que se faça o silêncio absoluto tão necessário pra eu ganhar tempo e pensar em algo e é aí então que minha intuição brilha, e não tenho dúvidas, é automático, coloco as mãos em megafone e solto-lhe o mais poderoso latido de um legítimo cão pastor que sei tão bem imitar, e isto faz o bichano emitir um berro horripilante e logo dar pelos ares um duplo mortal carpado, caindo no colo da madame, cara a cara, unhas cravadas nas coxas, o que faz a moça imediatamente arregalar os olhos e por sua vez soltar seu berro insano na cara do animal histérico e num ato de fuga desesperada, numa perda absoluta de equilíbrio e sanidade, vai mulher pra um lado, gato pra outro, num verdadeiro caos de ruídos indecifráveis e os dois desaparecem completamente de nossas vistas.
Neste momento a rede cai e assombrado noto que meu amigo e eu, depois do meteórico e aterrorizante desenlace, como resultado, estamos de joelhos, quase abraçados e com as respirações descompassadas. Jota, ainda agarrado tenazmente a minhas mãos, corta o silêncio.
- Caraca, véio. A mina tá de boa.
- É. Tua véia não abriu vaga.
- Não é véia, bro.
- Tá bom, tá bom... parius... mas depois dessa, tô precisando beber alguma coisa urgente.
- Tem Fanta na cozinha, man.
- Fechada?
- Não. Mas é deste mês ainda.
- Escroto.
- O universo, bro, o universo que me fez..
terça-feira, 6 de dezembro de 2016
DA ÁGUA DE COCO AO TERMÔMETRO
Tem uma propaganda de uma água de coco na TV que diz que é natural, sem gordura trans, sem conservantes e com nível de sódio igualzinho ao da fruta.
Legal. Eu provei. Muito bom. Só tem um probleminha.
Tem gosto de abacaxi.
Isso me fez lembrar que quando eu era pequeno, lançaram o Lanjal. Lanjal era um suco de laranja super concentrado. Vinha numa lata. Bastava colocar um pouquinho no copo e o resto de água. Meu pai se queixava de que além de caro, não tinha gosto de laranja. Pra gurizada acostumada com Ki-suco, Lanjal era uma festa, mas na verdade, Lanjal tinha gosto de kriptonita.
Meu pai, que era casquinha, também comprava um requeijão que vinha num copo bonito que depois usávamos na mesa. Ele passava o requeijão no pão, colocava na boca e rezingava que não tinha gosto de nada.
Por esta época, meu avô nos deu um som estereofônico. Era um equipamento pequeno, da marca Dual, mas tinha um som fortinho. Eu adorava. Meu pai, aos domingos, colocava discos eruditos pra girar no prato e reclamava que de alta fidelidade não tinha nada, pois ele não conseguia sentir que a orquestra estava tocando ao lado dele.
Dias depois ele chegou em casa todo contente com um disco do Zimbo Trio e fiquei puto quando descobri que era música sem cantor. Então foi a vez de eu me queixar. Disse a ele que não gostava daquilo. Eu tinha descoberto os Beatles e achava chato música sem voz. Ele, nem aí, colocava o long play na eletrola a todo momento até que chegou um dia em que ouvi e me veio o estalo;
"Bah! Que legal este pianinho".
Fiquei arrepiado. Daí eu mesmo tomava a iniciativa de colocar o Zimbo pra tocar. Agora penso que educação também é isso. O tipo de ar que dão pra gente respirar.
Tem um tema deste LP que toco, volta e meia. Samba do Veloso, de Baden e Vinícius. Sempre me traz uma boa onda. Uma das características que possui o Zimbo é o improviso, e sempre que o trio vai dar início a este, eu sinto como se fosse a decolagem de um avião.
Agora, com estas reminiscências, acabei de lembrar de um hábito que meu avô tinha e meu pai herdou. Colocar um termômetro na sala pra gente saber a temperatura. As pessoas se divertiam com muito pouca coisa naquelas priscas eras. Não é?
Lembro dele com as mãos cruzadas nas costas, em frente ao objeto, se queixando que a temperatura que marcava não estava correta, que com certeza o aparelho estaria estragado ou não seria de boa qualidade. Era um cético por natureza.
Meu pai daria muita risada desta água de coco da propaganda. E claro, reclamaria um bom bocado também.
Legal. Eu provei. Muito bom. Só tem um probleminha.
Tem gosto de abacaxi.
Isso me fez lembrar que quando eu era pequeno, lançaram o Lanjal. Lanjal era um suco de laranja super concentrado. Vinha numa lata. Bastava colocar um pouquinho no copo e o resto de água. Meu pai se queixava de que além de caro, não tinha gosto de laranja. Pra gurizada acostumada com Ki-suco, Lanjal era uma festa, mas na verdade, Lanjal tinha gosto de kriptonita.
Meu pai, que era casquinha, também comprava um requeijão que vinha num copo bonito que depois usávamos na mesa. Ele passava o requeijão no pão, colocava na boca e rezingava que não tinha gosto de nada.
Por esta época, meu avô nos deu um som estereofônico. Era um equipamento pequeno, da marca Dual, mas tinha um som fortinho. Eu adorava. Meu pai, aos domingos, colocava discos eruditos pra girar no prato e reclamava que de alta fidelidade não tinha nada, pois ele não conseguia sentir que a orquestra estava tocando ao lado dele.
Dias depois ele chegou em casa todo contente com um disco do Zimbo Trio e fiquei puto quando descobri que era música sem cantor. Então foi a vez de eu me queixar. Disse a ele que não gostava daquilo. Eu tinha descoberto os Beatles e achava chato música sem voz. Ele, nem aí, colocava o long play na eletrola a todo momento até que chegou um dia em que ouvi e me veio o estalo;
"Bah! Que legal este pianinho".
Fiquei arrepiado. Daí eu mesmo tomava a iniciativa de colocar o Zimbo pra tocar. Agora penso que educação também é isso. O tipo de ar que dão pra gente respirar.
Tem um tema deste LP que toco, volta e meia. Samba do Veloso, de Baden e Vinícius. Sempre me traz uma boa onda. Uma das características que possui o Zimbo é o improviso, e sempre que o trio vai dar início a este, eu sinto como se fosse a decolagem de um avião.
Agora, com estas reminiscências, acabei de lembrar de um hábito que meu avô tinha e meu pai herdou. Colocar um termômetro na sala pra gente saber a temperatura. As pessoas se divertiam com muito pouca coisa naquelas priscas eras. Não é?
Lembro dele com as mãos cruzadas nas costas, em frente ao objeto, se queixando que a temperatura que marcava não estava correta, que com certeza o aparelho estaria estragado ou não seria de boa qualidade. Era um cético por natureza.
Meu pai daria muita risada desta água de coco da propaganda. E claro, reclamaria um bom bocado também.
terça-feira, 29 de novembro de 2016
SE FOI FIDEL
Se foi o Fidel e tem gente comemorando muito.
Por que?
Porque Fidel foi um ditador que matou um monte de gente. E tirou a liberdade das pessoas também. Isso é muito feio. E as pessoas se revoltam com tanta maldade, mesmo que seja em outro país e apenas neste país. As pessoas de bem espumam quando ouvem falar em Fidel.
Já americanos matam no mundo todo, mas é em nome da liberdade. São outros quinhentos.
Isto sim é que é bacana. Matar gente pelo mundo todo em nome da liberdade e em nome de Deus. Invadir países, cooperar para a criação de ditaduras sanguinárias, tudo em nome da liberdade. Criar condições para que estes países se tornem apenas ruínas, um amontoado de poeira e buracos e uma legião de gente fugindo sem rumo. E este povo que fica sem país e sem pátria ainda vai incomodar nos países das gentes boas e brancas.
Os gringos fazem isso tudo em nome de um Deus bom e branco. Tudo em nome da liberdade que Fidel nunca soube respeitar.
Tem gente vibrando com a morte de Fidel.
Vibram porque Fidel matou ricos e matar ricos é algo que choca. A gente vê que todo mundo vira francês, vira belga, vira Charles Hebdo quando os terroristas matam ricos. É feio matar pessoas de bem, pessoas brancas e limpas.
Estes que comemoram a morte de Fidel não sabem quem foi Papa Doc. É só um exemplo, Poderia falar em Fulgêncio Batista ou Pinochet que também foram ditadores sanguinários, mas cito Papa Doc, que matou dezenas de milhares de pessoas, mas estas eram pessoas sem propriedade. Doc, na década de 50, depois de eleito, levou o Haiti rapidamente ao analfabetismo e ao caos na saúde. Mas Papa Doc ninguém sabe quem é, afinal o cara matava só pobres e matar pobres é algo que está dentro de um script aceitável. E com o apoio sabe de quem? Yankees, é claro. Os grandes defensores da liberdade. Tudo em nome de Deus.
Nestes novos tempos, as máscaras estão caindo assustadoramente e a perversidade está saindo do armário numa velocidade assombrosa. Dia destes, numa conversa que tentei ter com um fã do Bolsonaro falei a ele que acho que não se deve apoiar um político que faz apologia da tortura. Ele respondeu assim:
- Mas ele não rouba, né?
Eu não tive condição de continuar o papo, pois o cara está perdido nas prioridades básicas da existência. O sujeito parece que coloca o capital como principal importância da vida. Será isso? E tem um montão de gente que pensa mais ou menos assim. Isto me dá a impressão que esta racionalidade que afirmamos ter é algo ainda muito vago. Não evoluímos tanto assim, como acreditamos.
Aqui no Brasil ainda não consigo entender como esta gente que ajudou a derrubar um governo duvidoso e colocou em seu lugar uma quadrilha comprovada, ainda diz que agora está melhor. Não entendo estes cérebros. São cérebros ilógicos. São seres racionais?
Fidel se foi e tem gente comemorando muito. Não porque ele tenha matado e perseguido. Nada disso. Odeiam Fidel porque ele meteu a mão no capital da elite e mudou as regras do jogo. O fenômeno da revolução cubana sempre incomodou muito as pessoas. É uma espécie de pedra no sapato da consciência de todos nós. Fica ali, irritando. Então Fidel se foi e as pessoas vibram.
Quando Cuba se transformar em um lugar com uma mortalidade infantil graúda e o analfabetismo for de dois dígitos, estas pessoas, as pessoas de bem, vão parar de chiar. Vão dizer que as coisas voltaram finalmente ao seu devido lugar.
quarta-feira, 23 de novembro de 2016
O PERIGOSO CANGURU PERNETA
Um comunicador de televisão leu a seguinte pergunta que um assistente do programa havia feito à sexóloga.
- Toda vez que eu mudo a posição, a ereção se vai. O que devo fazer pra isto não acontecer?
A sexóloga respondeu com a maior simplicidade.
- Não mude a posição, não mude a posição.
A plateia riu muito da resposta da doutora e Sônia e Mauro, que estavam assistindo pela TV se olharam e riram também, pois eles não tinham este problema, apesar de estarem juntos havia mais de 30 anos.
Acontece que o casal tinha um truque. Haviam treinado a troca de posições, de forma que ela fosse a mais ágil e rápida possível afim de não dar chance pra coisa desmoronar.
Na noite seguinte estavam na cama e depois de meia hora de esquenta, começaram com o clássico papai-mamãe. Passaram-se alguns minutos e ela se dirige a ele.
- Querido, vamos mudar?
- Vamos. Pra qual você quer?
- Quem sabe Frango Assado?
- Tá. Acho legal essa. Preparada?
- Humhum.
- Então atenção. É no três.
- Tá.
- 1, 2 e....
- 3 aaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!
Os dois deram um berro de samurai sincronizado e em irrisórios dois décimos de segundo estavam colados de novo. Ele pergunta.
- E aí? Tudo certo? Sucesso?
- Sim querido.
- Tá dentro?
- Acho que tá.
- Como assim, acha que tá?
- Quer dizer... Peraí. Tá...Tá sim. Que gostoso.
- Eu adoro frango assado, minha franga.
- Eu também, meu galo!
Nem meio minuto depois é ele quem indaga.
- E aí? Quem sabe trocamos.
- Já?
- É.
- Tá bom. Pra qual?
- Canguru.
- Canguru perneta? Mas esta é sempre a última!
- Sabe o que é? Tem jogo na TV.
- Ah é. Final?
- Semi.
- Brasileirão?
- Não.
- Brasileirinho?
- Copa do Brasil, querida... mas quer parar de fazer perguntas? Desse jeito desanda a maionese. Trocamos ou não trocamos?
- Não sei não.
- Por que não sabe?
- Nunca mudamos de frango assado pra canguru perneta.
- E aí?
- Pode ser perigoso, amor.
- Bobagem. Não dá nada.
- Bom...se você diz.
- Preparada?
- Tô.
- Atenção! no três, hein? 1, 2 e...
- Aaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!
Pouco depois tavam os dois sentados no sofá da sala assistindo seu time metendo o terceiro. Estavam animadíssimos, apesar das bolsas de gelo que estavam usando pra ver se desmanchavam os galos azulados que tinham se formado nas respectivas testas. Nisso, os olhares dos dois se encontram. Caem na risada e é ela quem fala, simulando um chororô.
- Ai, amor.
- Tinhas razão, querida. Não te dei ouvidos. De frango pra canguru o furo é bem mais embaixo. Precisamos treinar esta reconfiguração.
- Igual te amo, amor.
- Me too.
- Toda vez que eu mudo a posição, a ereção se vai. O que devo fazer pra isto não acontecer?
A sexóloga respondeu com a maior simplicidade.
- Não mude a posição, não mude a posição.
A plateia riu muito da resposta da doutora e Sônia e Mauro, que estavam assistindo pela TV se olharam e riram também, pois eles não tinham este problema, apesar de estarem juntos havia mais de 30 anos.
Acontece que o casal tinha um truque. Haviam treinado a troca de posições, de forma que ela fosse a mais ágil e rápida possível afim de não dar chance pra coisa desmoronar.
Na noite seguinte estavam na cama e depois de meia hora de esquenta, começaram com o clássico papai-mamãe. Passaram-se alguns minutos e ela se dirige a ele.
- Querido, vamos mudar?
- Vamos. Pra qual você quer?
- Quem sabe Frango Assado?
- Tá. Acho legal essa. Preparada?
- Humhum.
- Então atenção. É no três.
- Tá.
- 1, 2 e....
- 3 aaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!
Os dois deram um berro de samurai sincronizado e em irrisórios dois décimos de segundo estavam colados de novo. Ele pergunta.
- E aí? Tudo certo? Sucesso?
- Sim querido.
- Tá dentro?
- Acho que tá.
- Como assim, acha que tá?
- Quer dizer... Peraí. Tá...Tá sim. Que gostoso.
- Eu adoro frango assado, minha franga.
- Eu também, meu galo!
Nem meio minuto depois é ele quem indaga.
- E aí? Quem sabe trocamos.
- Já?
- É.
- Tá bom. Pra qual?
- Canguru.
- Canguru perneta? Mas esta é sempre a última!
- Sabe o que é? Tem jogo na TV.
- Ah é. Final?
- Semi.
- Brasileirão?
- Não.
- Brasileirinho?
- Copa do Brasil, querida... mas quer parar de fazer perguntas? Desse jeito desanda a maionese. Trocamos ou não trocamos?
- Não sei não.
- Por que não sabe?
- Nunca mudamos de frango assado pra canguru perneta.
- E aí?
- Pode ser perigoso, amor.
- Bobagem. Não dá nada.
- Bom...se você diz.
- Preparada?
- Tô.
- Atenção! no três, hein? 1, 2 e...
- Aaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!
Pouco depois tavam os dois sentados no sofá da sala assistindo seu time metendo o terceiro. Estavam animadíssimos, apesar das bolsas de gelo que estavam usando pra ver se desmanchavam os galos azulados que tinham se formado nas respectivas testas. Nisso, os olhares dos dois se encontram. Caem na risada e é ela quem fala, simulando um chororô.
- Ai, amor.
- Tinhas razão, querida. Não te dei ouvidos. De frango pra canguru o furo é bem mais embaixo. Precisamos treinar esta reconfiguração.
- Igual te amo, amor.
- Me too.
segunda-feira, 21 de novembro de 2016
A AUTOCRÍTICA DA ESQUERDA E UM NOVO MODUS OPERANDI POLÍTICO
Assisti a um vídeo bem interessante. Americano. Fala sobre a vitória de Trump e é uma autocrítica da esquerda, centrada no fato de que “a esquerda decidiu que qualquer outra visão de mundo, qualquer outra opinião contrária a ela, é inaceitável.”
“Nós da esquerda não debatemos mais porque vencemos a GUERRA CULTURAL."
É o que o cara do vídeo afirma. Segue.
" Então, se a pessoa é da direita, ela é uma aberração, é malvada, é racista, é estúpida. Como você acha que as pessoas de direita vão votar, se você fala assim com elas? Quando é que alguém foi convencido, sendo insultado e rotulado? Então, se a pessoa for de direita, acaba sendo atacada por expor sua opinião. Por isso as pessoas de direita esperam até o momento de estar em frente às urnas. Ali não tem ninguém mais monitorando. Em frente às urnas não há culpa, nem vergonha e o cara pode fazer o que realmente pensa. E todas as pesquisas erraram. As pessoas não podem mais dizer o que pensam, pois a esquerda não as deixa se expressar. Então as pessoas de direita se sentem intimidadas até pra responder pesquisas. E mentem. “
Óh, que peninha...
É o que o vídeo diz. “Perdemos a capacidade do diálogo. Já não temos a habilidade para o convencimento.”
Então, baseado nesta profunda análise, quando você encontrar alguém que pede a volta dos militares, você não pode chamar de toupeira de jeito nenhum, pois ele vai ficar puto e vai querer que no futuro enfiem agulhas debaixo de suas unhas. Você tem de ter toda a calma, puxar uma cadeira e explicar pra pessoa, tintin por tintin todo o imbróglio. Ele não vai ouvir o que você tá dizendo, afinal ele já tá magoado com os esquerdopatas, mas não esmoreça. Continue explicando. Talvez leve alguns dias, ou até meses, mas a política é assim mesmo. É a arte do convencimento.
Quando alguém vier falar que Direitos Humanos é coisa de Petista bandido, você tem de sentar com o cara, com toda a calma e dar um breve histórico sobre o que se trata, de onde surgiu, em que época surgiu, pra que que serve o tratado dos direitos humanos. Nada de chamar o cara de pateta ou assemelhados, pois isso vai dar nele uma vontade danada de votar em quem faz apologia da tortura.
Quando alguém vier dizer que o Chico mama na lei Rouanet e que ele compra suas canções, você tem de se conter pra não chama-lo de imbecil e também não pode falar de jeito nenhum que é uma desonestidade intelectual seguir espalhando isso, mesmo depois de tudo ter sido desmentido, se não esse cara vai se injuriar e vai acabar votando num Pauderney ordinário destes.
Quando alguém vier dizer que as tropas do Maduro já estão no Brasil ou que os Haitianos fazem parte do exército comunista que a Dilma tava montando pra roubar as propriedades das pessoas de bem, você fica frio. Nada de chamar a figura de zumbi ou algo parecido. Eu sei, eu sei. Dá vontade até de espancar, mas segura a onda. Oferece um copo d’água com açúcar e meio Rivotril. Faz uns carinhos na cabeça e explica devagarinho que isto tudo que ele tá imaginando é meio que impossível que aconteça.
Quando alguém vier falar em meritocracia, deixa falar. Concorda com tudo. É isso aí. Num país onde há liberdade, todos temos chances iguais. O carinha pode ter nascido no morro, pode ser filho de mulher estuprada por traficante, pode ver gente degolada na frente de casa toda hora, pode cheirar cola com 10 anos. Não dá nada. Basta se esforçar um pouquinho (as pessoas de bem sempre gostam de frisar este “um pouquinho”) que se chega lá.
Quando alguém vier dizer que o estado está inchado e falido e que o estado tem de acabar por causa disso, nem pense em tocar no assunto da sonegação das mega empresas, porque o cara vai lhe responder que empresa sempre tem de receber isenção pra poder gerar empregos e que pra ter mais empregos ainda, seria importante também acabar com mamatas como férias, décimo terceiro e até horário pra almoço. É muita facilidade pro trabalhador e isto atrapalha a economia. O ministro da educação falou dia destes que é preciso acabar também com as regalias dos professores. Professor também atrapalha o mercado, ora vejam. Se o cara falar sobre tudo isso, e que inclusive está mais do que correto chamar o Frota pra dar pitaco sobre a educação, a princípio concorde com tudo. Talvez você consiga uma brecha pra confabular um pouco sobre o assunto com uma boa quantidade de diplomacia, com muito cuidado pra não fazer o cara chegar à conclusão de que ele não passa de um babaca perverso. Porque daí o sujeito fica bravo, né? Daí você já sabe. O cara vai pra urna e vai com raivinha.
É isso aí. Falha nossa. Quem sabe hora destas a gente acerta.
“Nós da esquerda não debatemos mais porque vencemos a GUERRA CULTURAL."
É o que o cara do vídeo afirma. Segue.
" Então, se a pessoa é da direita, ela é uma aberração, é malvada, é racista, é estúpida. Como você acha que as pessoas de direita vão votar, se você fala assim com elas? Quando é que alguém foi convencido, sendo insultado e rotulado? Então, se a pessoa for de direita, acaba sendo atacada por expor sua opinião. Por isso as pessoas de direita esperam até o momento de estar em frente às urnas. Ali não tem ninguém mais monitorando. Em frente às urnas não há culpa, nem vergonha e o cara pode fazer o que realmente pensa. E todas as pesquisas erraram. As pessoas não podem mais dizer o que pensam, pois a esquerda não as deixa se expressar. Então as pessoas de direita se sentem intimidadas até pra responder pesquisas. E mentem. “
Óh, que peninha...
É o que o vídeo diz. “Perdemos a capacidade do diálogo. Já não temos a habilidade para o convencimento.”
Então, baseado nesta profunda análise, quando você encontrar alguém que pede a volta dos militares, você não pode chamar de toupeira de jeito nenhum, pois ele vai ficar puto e vai querer que no futuro enfiem agulhas debaixo de suas unhas. Você tem de ter toda a calma, puxar uma cadeira e explicar pra pessoa, tintin por tintin todo o imbróglio. Ele não vai ouvir o que você tá dizendo, afinal ele já tá magoado com os esquerdopatas, mas não esmoreça. Continue explicando. Talvez leve alguns dias, ou até meses, mas a política é assim mesmo. É a arte do convencimento.
Quando alguém vier falar que Direitos Humanos é coisa de Petista bandido, você tem de sentar com o cara, com toda a calma e dar um breve histórico sobre o que se trata, de onde surgiu, em que época surgiu, pra que que serve o tratado dos direitos humanos. Nada de chamar o cara de pateta ou assemelhados, pois isso vai dar nele uma vontade danada de votar em quem faz apologia da tortura.
Quando alguém vier dizer que o Chico mama na lei Rouanet e que ele compra suas canções, você tem de se conter pra não chama-lo de imbecil e também não pode falar de jeito nenhum que é uma desonestidade intelectual seguir espalhando isso, mesmo depois de tudo ter sido desmentido, se não esse cara vai se injuriar e vai acabar votando num Pauderney ordinário destes.
Quando alguém vier dizer que as tropas do Maduro já estão no Brasil ou que os Haitianos fazem parte do exército comunista que a Dilma tava montando pra roubar as propriedades das pessoas de bem, você fica frio. Nada de chamar a figura de zumbi ou algo parecido. Eu sei, eu sei. Dá vontade até de espancar, mas segura a onda. Oferece um copo d’água com açúcar e meio Rivotril. Faz uns carinhos na cabeça e explica devagarinho que isto tudo que ele tá imaginando é meio que impossível que aconteça.
Quando alguém vier falar em meritocracia, deixa falar. Concorda com tudo. É isso aí. Num país onde há liberdade, todos temos chances iguais. O carinha pode ter nascido no morro, pode ser filho de mulher estuprada por traficante, pode ver gente degolada na frente de casa toda hora, pode cheirar cola com 10 anos. Não dá nada. Basta se esforçar um pouquinho (as pessoas de bem sempre gostam de frisar este “um pouquinho”) que se chega lá.
Quando alguém vier dizer que o estado está inchado e falido e que o estado tem de acabar por causa disso, nem pense em tocar no assunto da sonegação das mega empresas, porque o cara vai lhe responder que empresa sempre tem de receber isenção pra poder gerar empregos e que pra ter mais empregos ainda, seria importante também acabar com mamatas como férias, décimo terceiro e até horário pra almoço. É muita facilidade pro trabalhador e isto atrapalha a economia. O ministro da educação falou dia destes que é preciso acabar também com as regalias dos professores. Professor também atrapalha o mercado, ora vejam. Se o cara falar sobre tudo isso, e que inclusive está mais do que correto chamar o Frota pra dar pitaco sobre a educação, a princípio concorde com tudo. Talvez você consiga uma brecha pra confabular um pouco sobre o assunto com uma boa quantidade de diplomacia, com muito cuidado pra não fazer o cara chegar à conclusão de que ele não passa de um babaca perverso. Porque daí o sujeito fica bravo, né? Daí você já sabe. O cara vai pra urna e vai com raivinha.
É isso aí. Falha nossa. Quem sabe hora destas a gente acerta.
QUEM É QUE NÃO TEM UMA VONTADEZINHA DE CHORAR NA FRENTE DO COMPUTADOR?
Um amigo de minha mãe ligou pra ela querendo saber se ela ainda estava pelo planeta. Minha mãe tem 83, ele 92, e apesar da idade avançada, o cara é muito ativo. É viúvo, mora no Rio de Janeiro, é bom arquiteto e ainda trabalha.
Num determinado momento da conversa, confessou não chegar nem perto de computador. Tem nojo. Chama o computador de Capeta.
Celular também nunca teve, e caixa eletrônico, contou que dia destes, notando que o banco estava vazio, resolveu experimentar.
Terminou a história assim;
- Olha, Magali, comecei a mexer ali e quando vi, não sei como, os caras tinham me dado um empréstimo de 30 mil. Fiz um fiasco, ansioso atrás de atendentes e gerentes pra desfazer o imbróglio. Uma baita incomodação.
Já faz muito tempo, minha sogra deu um computador de presente pra minha mulher. Decidimos que a máquina ficaria na sala e eu, desconfiado como um cachorro de rua, levei uns 3 dias pra me decidir a mexer naquilo. Ficava só na volta, assistindo a minha mulher, com o tal de mouse na mão, tecendo todo tipo de elogios praquele trambolho.
Numa tarde em que não havia ninguém em casa, resolvi me aproximar e sentei pra furungar um pouco naquele mundo completamente inóspito. Depois de meia hora de clicks e desclicks a esmo, desliguei o PC, saí pela casa com as mãos nas costas e sentenciei taxativamente: Este troço não serve pra nada.
Por estes dias, a página do Hotmail, ou Outlook teve alterações. Carácoles. Por que estes caras tem de estar sempre mudando as paradas com as quais a gente cria intimidade? Pra melhorar, dizem eles. Tá certo. To me acostumando, embora muitas vezes, ache que eles complicam um pouco as coisas e assim as pioram. Até estes cabeções da informática erram. Já cheguei a esta conclusão, mais de uma vez.
Agora me diga. Quem é que não tem, de vez em quando, uma vontadezinha de chorar em frente ao computador? Por não saber os caminhos corretos pra se chegar até os fins? É preciso dispender um certo tempo pra estudar e descobrir todos os meandros, (ou pelo menos parte deles), que existem no universo gigantesco deste eletrodoméstico. Mas temos preguiça disto. A própria tecnologia nos torna ainda mais preguiçosos pra fazer este tipo de coisa. Estudar a máquina para dela tirar melhore proveito. Sempre queremos uma resposta rápida e precisa e quando ela não vem óh... vontadezinha de chorar. Às vezes, a resposta está na tela, na nossa cara, mas como estamos putos, não conseguimos enxergá-la. Não é?
Tem uma frase do Nietzsche (esse nome tenho de copiar letra por letra) que fala sobre este assunto; "Sempre que numa inovação nos mostram algo de antigo, ficamos sossegados."
quarta-feira, 16 de novembro de 2016
VINÃOVI
Não vi Tom.
Assisti a Stevie Wonder bem de pertinho e a Ray Charles bem de longinho.
Não vi Santana nem Bil Evans que estiveram aqui em PoA, mas por aqui assisti a Corea e a Hancock juntos e também ao austríaco Zawinul que me fez perder a tampa do cérebro quando executou umas escalas num teclado invertido que havia programado com baixos à direita e notas altas à esquerda.
Não vi Miles. Um amigo contou que quando se iniciou o concerto, parecia uma nave espacial pousando.
Fui assistir a Pastorius em Madrid, só que ele não foi. Disseram que não conseguiram tirar o cara da cama de um hotel da Bélgica. Doidaraço. Pouco tempo depois morreu.
Nesta época, fiquei sabendo que Corea fez um concerto em Barcelona e usando um efeito de voz no teclado somado aos vocalizes da cantora Gayle Moran, levou a plateia a experimentar o fenômeno da histeria coletiva. Quem já ouviu turbina de avião a todo vapor, bem de perto, sabe mais ou menos sobre o que estou falando.
Também nesta mesma época e cidade, me contaram que Keith Jarret, ao qual nunca assisti, estava passando o som, infernizando a vida de um afinador de pianos, quando de repente encasquetou que havia um calombo em cima do palco e disse que com aquilo não tocaria. Tiveram de chamar marceneiros pra tirar o carpete e aplainar a suposta saliência até ficar do agrado do lock.
Vi Al Jarreau e Mclaughlin na Plaza de las Ventas em Madrid. Foi bem legal, mas na noite anterior havia assistido ao melhor show de minha vida no mesmo local. George Benson. Isto foi em 86. Já faz 30 anos.
Em Madrid, num ginásio, assisti a Caetano e no dia seguinte, vi Bethânea de longe e ouvi os espanhóis a meu lado comentando que ela era gostosa. Estávamos bem longe mesmo.
Assisti à Guernica, de Picasso.
Sim, é um quadro. Mas tem som. Guernica grita.
Da mesma forma que quando pela primeira vez caminhei pelas areias de Copacabana e me deparei com aquele fantástico paredão de prédios. É uma sinfonia aquela arquitetura toda. A história, ali berra.
Assim como berrava um morro que vi em frente ao mar, numa praia da Bahia, num dia em que fazia um sol de justiça. Uma parede de verde exuberante que emanava sons de vários séculos.
Já faz anos, subi as escadas de um teatro de Santa Rosa no exato momento em que GibaGiba, Neto, Ernesto, Neguinho Edson e outros, de que não recordo o nome, iniciavam a apresentação de uma canção. Alguma coisa diferente começou a acontecer ali. Ficou tudo conectado e em câmera lenta. Foi um contato com um algo a mais, talvez aquilo que costumamos chamar de superior. E não foi loucura da minha cabeça. Quem estava comigo dividiu o assombro. Ficamos de boca aberta, aparvalhados, nos perguntando o que havia acontecido, quando a canção terminou.
Num bar chamado Oba Oba, assisti a um guitarrista inglês dando uma canja no meio de um grupo grande de brasileiros. O pau tava comendo. O ritmo era tribal em dois acordes. O cara botou uma distorção e fez um solo esquisito, torto pra caramba com poucas notas. Num determinado momento meteu a alavanca e veio a microfonia aquela. Foi meneando o corpo bem devagar praquele som ir desaparecendo pouco a pouco. No momento em que o som da guitarra sumiu por completo, ele ficou sem emitir nenhuma nota por alguns compassos, com a postura física estática, e os músicos todos entenderam que aquela pausa era uma pausa genial e fazia parte do solo.
Não vi Tom...mas vi Elis.
pOa - novembro - 16
Assisti a Stevie Wonder bem de pertinho e a Ray Charles bem de longinho.
Não vi Santana nem Bil Evans que estiveram aqui em PoA, mas por aqui assisti a Corea e a Hancock juntos e também ao austríaco Zawinul que me fez perder a tampa do cérebro quando executou umas escalas num teclado invertido que havia programado com baixos à direita e notas altas à esquerda.
Não vi Miles. Um amigo contou que quando se iniciou o concerto, parecia uma nave espacial pousando.
Fui assistir a Pastorius em Madrid, só que ele não foi. Disseram que não conseguiram tirar o cara da cama de um hotel da Bélgica. Doidaraço. Pouco tempo depois morreu.
Nesta época, fiquei sabendo que Corea fez um concerto em Barcelona e usando um efeito de voz no teclado somado aos vocalizes da cantora Gayle Moran, levou a plateia a experimentar o fenômeno da histeria coletiva. Quem já ouviu turbina de avião a todo vapor, bem de perto, sabe mais ou menos sobre o que estou falando.
Também nesta mesma época e cidade, me contaram que Keith Jarret, ao qual nunca assisti, estava passando o som, infernizando a vida de um afinador de pianos, quando de repente encasquetou que havia um calombo em cima do palco e disse que com aquilo não tocaria. Tiveram de chamar marceneiros pra tirar o carpete e aplainar a suposta saliência até ficar do agrado do lock.
Vi Al Jarreau e Mclaughlin na Plaza de las Ventas em Madrid. Foi bem legal, mas na noite anterior havia assistido ao melhor show de minha vida no mesmo local. George Benson. Isto foi em 86. Já faz 30 anos.
Em Madrid, num ginásio, assisti a Caetano e no dia seguinte, vi Bethânea de longe e ouvi os espanhóis a meu lado comentando que ela era gostosa. Estávamos bem longe mesmo.
Assisti à Guernica, de Picasso.
Sim, é um quadro. Mas tem som. Guernica grita.
Da mesma forma que quando pela primeira vez caminhei pelas areias de Copacabana e me deparei com aquele fantástico paredão de prédios. É uma sinfonia aquela arquitetura toda. A história, ali berra.
Assim como berrava um morro que vi em frente ao mar, numa praia da Bahia, num dia em que fazia um sol de justiça. Uma parede de verde exuberante que emanava sons de vários séculos.
Já faz anos, subi as escadas de um teatro de Santa Rosa no exato momento em que GibaGiba, Neto, Ernesto, Neguinho Edson e outros, de que não recordo o nome, iniciavam a apresentação de uma canção. Alguma coisa diferente começou a acontecer ali. Ficou tudo conectado e em câmera lenta. Foi um contato com um algo a mais, talvez aquilo que costumamos chamar de superior. E não foi loucura da minha cabeça. Quem estava comigo dividiu o assombro. Ficamos de boca aberta, aparvalhados, nos perguntando o que havia acontecido, quando a canção terminou.
Num bar chamado Oba Oba, assisti a um guitarrista inglês dando uma canja no meio de um grupo grande de brasileiros. O pau tava comendo. O ritmo era tribal em dois acordes. O cara botou uma distorção e fez um solo esquisito, torto pra caramba com poucas notas. Num determinado momento meteu a alavanca e veio a microfonia aquela. Foi meneando o corpo bem devagar praquele som ir desaparecendo pouco a pouco. No momento em que o som da guitarra sumiu por completo, ele ficou sem emitir nenhuma nota por alguns compassos, com a postura física estática, e os músicos todos entenderam que aquela pausa era uma pausa genial e fazia parte do solo.
Não vi Tom...mas vi Elis.
pOa - novembro - 16
quinta-feira, 10 de novembro de 2016
PAULINHA E O JOTA
Jota e eu somos pessoas parecidas. Falamos pouco e quase não sorrimos. Além destas particularidades, meu amigo tem também o gesto antes da palavra. É como se ele se expressasse antes com as mãos e depois com a boca. Cria uma espécie de dessincronia que dá a sensação de repetidas falhas de dublagem.
Mas o que quero contar é que por estes dias, o Jota andou lançando o verbo em cima da Paulinha e não é que foi bem sucedido?
Tem muita sorte meu amigo, afinal de contas, Paulinha tem quase 20 a menos, um corpão fantástico, resultado de 5 dias semanais de academia e a menina, na tarde de ontem, convidou-o pra tomar um inocente café em sua casa e logo rolou um clima forte e de repente se pelaram e foram pra cama, e a menina possuidora de um fogo descomunal aliado a um fôlego de maratonista foi tomando a iniciativa, já se dirigindo aos entretantos, deixando meu amigo atônito e aparvalhado, se rendendo, sem reação, àquele tsunami de volúpia, e a moça bombada bombou e bombou e bombou, e o Jota resolveu que não ia se michar, que ia encarar aquele pique, e bombou também, e ela com aquele corpo atlético feito de concreto resolveu então cavalgar, e aumentou o ritmo e fez exigências e o cara foi se virando do jeito que podia, caprichando na performance, na raça, bombando legal, o pulmão, um chinelo velho, já tinha começado a chiar um pouquinho da bronquite, mas não dá nada, vá bomba e vá bomba até que de repente rolou um estalo no peito, um troço agudo, assim como um pneu que fura com um prego, mas Paulinha nem aí, nem bola, não viu nada, seguiu no ritmo frenético, que gostoso, até que de repente reparou que a coisa tinha ficado esquisita, notou que a parada desandava e com assombro viu que o rosto do Jotinha tinha adquirido uma tonalidade azulada, os olhos do querido estavam mortiços e ele esboçava o sorriso idiota de quem já não estava mais entre nós, então Paulinha paralisou os movimentos e gritou, não sem antes dar um tapão naquela cara apatetada pra ver se trazia o cara de volta.
- O que é isso, homem?! Tás passando mal?!
A resposta veio grave, como se ele estivesse sendo estrangulado já dentro da cova.
- Tô morrendo.
- Não faz isso não! Não vai morrer aqui na minha casa não! De jeito nenhum!
- Não?
- Não. Isso vai dar merda, porra! Eu sou casada!
Já com a baba escorrendo pelos cantos da boca, com um cabelo de voz, meu amigo respondeu.
- Devia ter me contado. Acho um tesão ficar com mulher casada.
- Mas tu não pode morrer aqui!
- Tranquila, gata.
- Como é que vou ficar tranquila, Jota?
- Se eu bater as botas, arrasta meu corpo pelo apartamento e larga lá no corredor.
- Ah sim, que beleza! E como vou explicar um morto pelado na frente da minha porta?
- Sei lá. Diz que quando tu chegou não tinha ninguém ali. Diz que não sabe de nada. Faz uma queixa pro síndico depois, acusando o zelador de relapso e porco. Ah. E minhas roupas, picota tudo e vai jogando no vaso aos poucos e dando descarga.
Neste momento, uma enfermeira entrou no quarto 156 do Hospital de Cardiologia de PoA e interrompeu o relato que o Jota me fazia. Uma baixinha simpática, que já foi mandando:
- E aí? Como é que tá, Seu Jéferson? Tudo tranquilo? Precisamos trocar o soro agora.
Jota, sem mudar um pelo da fisionomia, ofereceu o braço à atendente e, me olhando fixamente, continuou solando com sua monocórdica e lenta voz.
- Daí, véio, a mina pulou da cama no desespero e chamou a Samu. Chegaram rápido, ainda bem, e me botaram uma máscara, que eu tava ruim de ar, brother, tava me finando, pensei que ia abrir vaga, e ontem de noite me furaram com o cateter e deram uma desentupida no bobo. Acho que me safei desta vez, mas vou ter de regrar minha vida, véio, porque senão não vai ter mais mina e sem mina não tem vida, Bro.
Jota fez uma pausa pra fiscalizar a troca do soro e a enfermeira aproveitou a pausa.
- Agora, Seu Jeferson, vou pedir pra seu amigo sair, pra revezar a visita. Tem gente aí fora querendo lhe ver.
Jota franziu a testa e indagou.
- E quem seria tal pessoa?
- Sua filha Paulinha. Está ansiosa. Faz mais de meia hora que espera.
A informação fez Jota se engasgar com o cuspe e experimentar um breve acesso de tosse. Nos olhamos, compenetrados e sérios, estudando a situação. Já havia comentado que quase nunca sorrimos, e isto acontece até mesmo quando a piada é boa.
Antes de fechar a porta dei um aceno a meu amigo que me olhava preocupado, com os olhos de um cachorro que lambeu graxa.
Ao passar pelo saguão me deparei com Paulinha sentada no sofá, com uma expressão de Madre Teresa no rosto. Reparei na mini saia e na rasteirinha. Coxas de tirar a paz do planeta. E ela vai entrar no quarto assim: Exuberando.
Oremos
PoA - outubro - 16
Mas o que quero contar é que por estes dias, o Jota andou lançando o verbo em cima da Paulinha e não é que foi bem sucedido?
Tem muita sorte meu amigo, afinal de contas, Paulinha tem quase 20 a menos, um corpão fantástico, resultado de 5 dias semanais de academia e a menina, na tarde de ontem, convidou-o pra tomar um inocente café em sua casa e logo rolou um clima forte e de repente se pelaram e foram pra cama, e a menina possuidora de um fogo descomunal aliado a um fôlego de maratonista foi tomando a iniciativa, já se dirigindo aos entretantos, deixando meu amigo atônito e aparvalhado, se rendendo, sem reação, àquele tsunami de volúpia, e a moça bombada bombou e bombou e bombou, e o Jota resolveu que não ia se michar, que ia encarar aquele pique, e bombou também, e ela com aquele corpo atlético feito de concreto resolveu então cavalgar, e aumentou o ritmo e fez exigências e o cara foi se virando do jeito que podia, caprichando na performance, na raça, bombando legal, o pulmão, um chinelo velho, já tinha começado a chiar um pouquinho da bronquite, mas não dá nada, vá bomba e vá bomba até que de repente rolou um estalo no peito, um troço agudo, assim como um pneu que fura com um prego, mas Paulinha nem aí, nem bola, não viu nada, seguiu no ritmo frenético, que gostoso, até que de repente reparou que a coisa tinha ficado esquisita, notou que a parada desandava e com assombro viu que o rosto do Jotinha tinha adquirido uma tonalidade azulada, os olhos do querido estavam mortiços e ele esboçava o sorriso idiota de quem já não estava mais entre nós, então Paulinha paralisou os movimentos e gritou, não sem antes dar um tapão naquela cara apatetada pra ver se trazia o cara de volta.
- O que é isso, homem?! Tás passando mal?!
A resposta veio grave, como se ele estivesse sendo estrangulado já dentro da cova.
- Tô morrendo.
- Não faz isso não! Não vai morrer aqui na minha casa não! De jeito nenhum!
- Não?
- Não. Isso vai dar merda, porra! Eu sou casada!
Já com a baba escorrendo pelos cantos da boca, com um cabelo de voz, meu amigo respondeu.
- Devia ter me contado. Acho um tesão ficar com mulher casada.
- Mas tu não pode morrer aqui!
- Tranquila, gata.
- Como é que vou ficar tranquila, Jota?
- Se eu bater as botas, arrasta meu corpo pelo apartamento e larga lá no corredor.
- Ah sim, que beleza! E como vou explicar um morto pelado na frente da minha porta?
- Sei lá. Diz que quando tu chegou não tinha ninguém ali. Diz que não sabe de nada. Faz uma queixa pro síndico depois, acusando o zelador de relapso e porco. Ah. E minhas roupas, picota tudo e vai jogando no vaso aos poucos e dando descarga.
Neste momento, uma enfermeira entrou no quarto 156 do Hospital de Cardiologia de PoA e interrompeu o relato que o Jota me fazia. Uma baixinha simpática, que já foi mandando:
- E aí? Como é que tá, Seu Jéferson? Tudo tranquilo? Precisamos trocar o soro agora.
Jota, sem mudar um pelo da fisionomia, ofereceu o braço à atendente e, me olhando fixamente, continuou solando com sua monocórdica e lenta voz.
- Daí, véio, a mina pulou da cama no desespero e chamou a Samu. Chegaram rápido, ainda bem, e me botaram uma máscara, que eu tava ruim de ar, brother, tava me finando, pensei que ia abrir vaga, e ontem de noite me furaram com o cateter e deram uma desentupida no bobo. Acho que me safei desta vez, mas vou ter de regrar minha vida, véio, porque senão não vai ter mais mina e sem mina não tem vida, Bro.
Jota fez uma pausa pra fiscalizar a troca do soro e a enfermeira aproveitou a pausa.
- Agora, Seu Jeferson, vou pedir pra seu amigo sair, pra revezar a visita. Tem gente aí fora querendo lhe ver.
Jota franziu a testa e indagou.
- E quem seria tal pessoa?
- Sua filha Paulinha. Está ansiosa. Faz mais de meia hora que espera.
A informação fez Jota se engasgar com o cuspe e experimentar um breve acesso de tosse. Nos olhamos, compenetrados e sérios, estudando a situação. Já havia comentado que quase nunca sorrimos, e isto acontece até mesmo quando a piada é boa.
Antes de fechar a porta dei um aceno a meu amigo que me olhava preocupado, com os olhos de um cachorro que lambeu graxa.
Ao passar pelo saguão me deparei com Paulinha sentada no sofá, com uma expressão de Madre Teresa no rosto. Reparei na mini saia e na rasteirinha. Coxas de tirar a paz do planeta. E ela vai entrar no quarto assim: Exuberando.
Oremos
PoA - outubro - 16
terça-feira, 8 de novembro de 2016
O JOTA3
Jota tinha saído mais cedo do trabalho e andava pela Osvaldo Aranha quando parou na frente do cinema Baltimore pra ver o que estava passando.
O filme era brasileiro, Marília e Marina, e já que tinha tempo, Jota resolveu entrar. Ele gostava muito de filme brasileiro, porque tinha mulher pelada e cena de sexo, e então pagou a entrada e se aboletou num bom lugar central, já que havia poucas pessoas na sala.
Jota estava apreciando a película,que apesar de ser um tanto poética e lenta, já nos primeiros instantes o premiou com uma cena tórrida que o deixou bem animado, mas por ser jovem e também pelo fato ter acontecido na década de 70, época em que tudo ainda era novo, Jota nunca tinha visto - e nem imaginava que pudesse existir tal maravilha - uma cena de lesbianismo. E tampouco estava preparado para isto, como veremos a seguir.
Quando Marília e Marina iniciaram sua cena com aquele diálogo revelador, um brilho logo tomou conta do olhar de Jota e quando elas começaram a se beijar, ele sentiu seu coração bater na altura do pescoço e então quando se tocaram mais intimamente, o rapaz não teve dúvidas que estava tendo um treco.
As pessoas que estavam mais perto, já preocupadas com aqueles vagos murmúrios, resolveram pedir ajuda quando Jota emitiu um gemido mais alto junto a um suspiro interminável.
As luzes se acenderam e rapidamente dois homens entraram na sala e encontraram aquele rapaz empertigado e imóvel, com o rosto contorcido e fios de baba escorrendo pelo queixo. Um dos homens se aproximou de Saulo e fez algumas perguntas, mas recebeu como resposta apenas algumas poucas palavras balbuciadas sem sentido, algo que mais se parecia a uma reza turca.
- Certamente um mal súbito, pessoal, falou o homem para tranquilizar a plateia.
Notaram então que teriam uma certa dificuldade para tirar o jovem dali, pois o corpo enrijecido dificultaria desvencilhar suas pernas de debaixo da cadeira da frente. Depois de deliberarem com duas senhoras que davam palpites variados, conseguiram com uma manobra engenhosa erguer o cara, e assim o retiraram do cinema.
Por sorte o Cine Baltimore ficava em frente ao Pronto Socorro e os dois homens, correndo entre tropeções, cruzaram a Osvaldo Aranha carregando Saulo como se fosse um tapete enrolado.
Foram direto à emergência e o depositaram numa maca que por sorte estava sobrando. Prontamente chegaram duas enfermeiras, que ao repararem no estranho brilho daquele olhar que agora se fixava incessantemente nelas, acharam mais seguro que o rapaz passasse à frente dos outros pacientes e o levaram direto à sala de neurologia.
Jota que aos poucos ia se recuperando, pode ver o médico se aproximar dele e das enfermeiras, que já começavam a desabotoar sua camisa. Muito magro, beirando os 50 e com um simpático sorriso de caveira o doutor perguntou.
- O que houve, caro jovem?
Jota começou a relatar, enquanto era auscultado.
- Pois é, Doutor, eu estava no Baltimore assistindo Marília e Marina.
- Sim, não assisti ainda. Filme baseado num poema de Vinícius. Gosto muito do poeta. Vá falando.
- Num determinado momento as duas começaram com um clima sensual e isto me pegou de surpresa, então comecei a sentir um calor na nuca.
- Sim rapaz, vire para a parede para eu ouvir sua carótida. Continue.
- Elas ficaram se olhando, foram tirando a roupa.
- Sim meu jovem, diga.
- Os peitos eram muito lindos, doutor. Se acariciavam....
- Sim, rapaz, deixe eu medir sua pressão, mas conte mais......
- Então começaram a se beijar....
- Simmm....isto é bom...quero dizer, é bom ver que sua pressão está baixando. Mas continue.
- e a se tocarem com volúpia...então minha vista foi ficando turva.
- E elas se tocavam muito rapaz?
- Muito, Doutor. Chegou um momento que começaram a se lamber os rostos.
- Sim? Os rostos, é? Acho que vou medir minha pressão também. E então...?
- Então passaram a se lamber os ombros e tudo mais,Doutor e então deitaram na cama com os corpos completamente colados.
Jota não ouviu resposta nenhuma e aquele silêncio o fez virar o rosto quando se deparou com o médico com um olhar transtornado e a expressão possuída por uma careta disforme, sendo amparado pelas enfermeiras que o impediam de cair ao solo ao mesmo tempo que tentavam se livrar, com aflição, das inexplicáveis tentativas que o doutor fazia
O filme era brasileiro, Marília e Marina, e já que tinha tempo, Jota resolveu entrar. Ele gostava muito de filme brasileiro, porque tinha mulher pelada e cena de sexo, e então pagou a entrada e se aboletou num bom lugar central, já que havia poucas pessoas na sala.
Jota estava apreciando a película,que apesar de ser um tanto poética e lenta, já nos primeiros instantes o premiou com uma cena tórrida que o deixou bem animado, mas por ser jovem e também pelo fato ter acontecido na década de 70, época em que tudo ainda era novo, Jota nunca tinha visto - e nem imaginava que pudesse existir tal maravilha - uma cena de lesbianismo. E tampouco estava preparado para isto, como veremos a seguir.
Quando Marília e Marina iniciaram sua cena com aquele diálogo revelador, um brilho logo tomou conta do olhar de Jota e quando elas começaram a se beijar, ele sentiu seu coração bater na altura do pescoço e então quando se tocaram mais intimamente, o rapaz não teve dúvidas que estava tendo um treco.
As pessoas que estavam mais perto, já preocupadas com aqueles vagos murmúrios, resolveram pedir ajuda quando Jota emitiu um gemido mais alto junto a um suspiro interminável.
As luzes se acenderam e rapidamente dois homens entraram na sala e encontraram aquele rapaz empertigado e imóvel, com o rosto contorcido e fios de baba escorrendo pelo queixo. Um dos homens se aproximou de Saulo e fez algumas perguntas, mas recebeu como resposta apenas algumas poucas palavras balbuciadas sem sentido, algo que mais se parecia a uma reza turca.
- Certamente um mal súbito, pessoal, falou o homem para tranquilizar a plateia.
Notaram então que teriam uma certa dificuldade para tirar o jovem dali, pois o corpo enrijecido dificultaria desvencilhar suas pernas de debaixo da cadeira da frente. Depois de deliberarem com duas senhoras que davam palpites variados, conseguiram com uma manobra engenhosa erguer o cara, e assim o retiraram do cinema.
Por sorte o Cine Baltimore ficava em frente ao Pronto Socorro e os dois homens, correndo entre tropeções, cruzaram a Osvaldo Aranha carregando Saulo como se fosse um tapete enrolado.
Foram direto à emergência e o depositaram numa maca que por sorte estava sobrando. Prontamente chegaram duas enfermeiras, que ao repararem no estranho brilho daquele olhar que agora se fixava incessantemente nelas, acharam mais seguro que o rapaz passasse à frente dos outros pacientes e o levaram direto à sala de neurologia.
Jota que aos poucos ia se recuperando, pode ver o médico se aproximar dele e das enfermeiras, que já começavam a desabotoar sua camisa. Muito magro, beirando os 50 e com um simpático sorriso de caveira o doutor perguntou.
- O que houve, caro jovem?
Jota começou a relatar, enquanto era auscultado.
- Pois é, Doutor, eu estava no Baltimore assistindo Marília e Marina.
- Sim, não assisti ainda. Filme baseado num poema de Vinícius. Gosto muito do poeta. Vá falando.
- Num determinado momento as duas começaram com um clima sensual e isto me pegou de surpresa, então comecei a sentir um calor na nuca.
- Sim rapaz, vire para a parede para eu ouvir sua carótida. Continue.
- Elas ficaram se olhando, foram tirando a roupa.
- Sim meu jovem, diga.
- Os peitos eram muito lindos, doutor. Se acariciavam....
- Sim, rapaz, deixe eu medir sua pressão, mas conte mais......
- Então começaram a se beijar....
- Simmm....isto é bom...quero dizer, é bom ver que sua pressão está baixando. Mas continue.
- e a se tocarem com volúpia...então minha vista foi ficando turva.
- E elas se tocavam muito rapaz?
- Muito, Doutor. Chegou um momento que começaram a se lamber os rostos.
- Sim? Os rostos, é? Acho que vou medir minha pressão também. E então...?
- Então passaram a se lamber os ombros e tudo mais,Doutor e então deitaram na cama com os corpos completamente colados.
Jota não ouviu resposta nenhuma e aquele silêncio o fez virar o rosto quando se deparou com o médico com um olhar transtornado e a expressão possuída por uma careta disforme, sendo amparado pelas enfermeiras que o impediam de cair ao solo ao mesmo tempo que tentavam se livrar, com aflição, das inexplicáveis tentativas que o doutor fazia
segunda-feira, 7 de novembro de 2016
CREDO
O mundo tá ficando com a cara do Trump.
O Brasil tá ficando com a cara do Bolsonaro.
A elite brasileira decidiu tirar a máscara de vez e agora o combate ao pobre é a céu aberto.
Uma figura abjeta concorreu à prefeitura de Curitiba depois de conclamar seu nojo ao pobre. O espécime foi eleito, e foi eleito pelo pobre.
Em PoA e em Sampa foi coisa parecida. É o suicídio em massa do pobrerio.
No Rio é diferente, SQN.
Lá, o pobre que elegeu o Crivella é 10% ainda mais pobre pois o otário marcha todo o mês com o dízimo. Faz tempo que a cidade do Rio de Janeiro vai deixando de ser malandra pra se tornar mané.
E essa gurizadinha que tá ocupando? Tão sozinhos que dá pena. Sem apoio de lado algum. Só eles nesta luta perdida. Tá tudo dominado. É tudo quadrilha. A lei é quebrada por quem deveria cuidar da lei. Aqueles que eram nossa última esperança fazem parte da conluio quando silenciam, quando tardam, quando postergam. É a nossa cavalaria que, tristemente, nunca chegou.
Mas a gurizada é diferente. Ainda é pura. É digna.
O Brasil tá ficando com a cara do Bolsonaro.
A elite brasileira decidiu tirar a máscara de vez e agora o combate ao pobre é a céu aberto.
Uma figura abjeta concorreu à prefeitura de Curitiba depois de conclamar seu nojo ao pobre. O espécime foi eleito, e foi eleito pelo pobre.
Em PoA e em Sampa foi coisa parecida. É o suicídio em massa do pobrerio.
No Rio é diferente, SQN.
Lá, o pobre que elegeu o Crivella é 10% ainda mais pobre pois o otário marcha todo o mês com o dízimo. Faz tempo que a cidade do Rio de Janeiro vai deixando de ser malandra pra se tornar mané.
E essa gurizadinha que tá ocupando? Tão sozinhos que dá pena. Sem apoio de lado algum. Só eles nesta luta perdida. Tá tudo dominado. É tudo quadrilha. A lei é quebrada por quem deveria cuidar da lei. Aqueles que eram nossa última esperança fazem parte da conluio quando silenciam, quando tardam, quando postergam. É a nossa cavalaria que, tristemente, nunca chegou.
Mas a gurizada é diferente. Ainda é pura. É digna.
Aquela menina que discursou com tanta emoção e brilho na câmara de alguma cidade do Paraná, num determinado momento foi interrompida pelo cara que presidia aquela naba. O escroto, teatralmente, se mostrou indignadíssimo com as palavras dela. Mas vocês viram a lata daquele sujeito? Prestaratenção??? Parecia figura tirada dos filmes do Calígula. Um ser decadente, um ordinário decrépito. É a cara do povo que o colocou ali.
Os políticos brasileiros são a nossa imagem. Foi isto que nos tornamos com o passar do tempo e este panorama só vai mudar se houver uma imediata e violenta invasão de baratas venusianas.
Se não for assim, acho que fica pra próxima.
pOa - novembro - 16
Os políticos brasileiros são a nossa imagem. Foi isto que nos tornamos com o passar do tempo e este panorama só vai mudar se houver uma imediata e violenta invasão de baratas venusianas.
Se não for assim, acho que fica pra próxima.
pOa - novembro - 16
sábado, 29 de outubro de 2016
FARELOS NA CAMA
Há farelos na cama sobrados da noite passada que pinicam minhas costas e esta sensação aliada a uma ressaca monstra me faz levantar. Havia também calor e suor debaixo das cobertas. Já aqui fora faz frio e só há uma blusa à mão. É peça de roupa feita de lã, e sei que em contato com a pele também vai irritar. Depois de vesti-la e de não encontrar chinelos, deixo o quarto com a antiga sensação de haver deitado nu na grama, tomado pela comichão causada por um ser invisível que em outra era chamávamos de micóliuns. No momento de entrar no banheiro bato com o cotovelo no batente da porta. O golpe não machuca tanto o braço, no entanto o sobressalto faz minha coluna parecer desconjuntar-se. Urino e ao sentir respingar canelas e pés, lembro de um colega alemão que sugeria fazer esta atividade sentado e ele tinha lúcidas razões para isso. Então reparo no espelho a careta que surge em meu rosto no exato instante em que minha língua encontra uma afta novinha em folha. Quando inicio a escovação dos dentes descubro também que se avizinha um torcicolo que promete muito. Da tríade afta-torcicolo-soluço só me falta este último. Desajeitado, escovo a afta com rudeza e isto me faz lacrimejar um pouco. Lavo o rosto, também de forma estabanada, e sinto a água congelando meus antebraços, escorrendo para dentro do blusão. Invado a cozinha à procura de algo que sacie minha sede e para amplificar meu desassossego, percebo que faltou luz e isto já deve fazer um bom tempo. Não tenho água potável na geladeira nem fora dela. Encontro meia garrafinha de coca do mês passado e entorno nauseado o líquido doce e morno, enquanto observo pela janela da área a chuva torrencial que desaba sobre a grande cidade de trânsito inerte e lembro que tenho uma reunião às 10, lembro também que a bateria de meu celular arriou no meio da festa de ontem e como não tenho luz, concluo que não tenho rádio, não tenho TV, nem computador e nem puta ideia de que horas sejam. Não sei qual foi a data em que acabei me tornando mais um tolo digital. Pensando que seria por demais ridículo bater à porta de algum vizinho para pedir a hora, o que me resta é sair por aí para saber a quantas anda o mundo, então decido meter-me em minhas roupas sem banho mesmo, pois banho quente também está em falta. Ao deixar a cozinha sinto os pés gelados pela pedra e como se não bastasse, o arroz cozido da véspera se gruda em minhas solas. De volta ao quarto me visto como um autômato, sofro para pentear meus cabelos emaranhados e me obrigo a cortar dois chumaços. Dou uma geral na cozinha para ver se encontro velas e a busca é infrutífera. Não tenho velas e se for pensar bem, acho que nunca tive e mesmo que as tivesse, de nada adiantaria pois também não possuo isqueiro e muito menos fósforos. Seria o máximo poder dispor de uma lanterna neste momento em que preciso vencer 25 lances de escada, mas a lanterna não passa de uma longínqua figurinha na memória. Inicio então a lenta descida dos degraus na escuridão total, pois as luzes de emergência devem ter se esgotado. Vou encostado pela parede, pé ante pé, no breu e no silêncio e resolvo não contar os andares vencidos, mas agora talvez esteja no 21, e no 21 um tipo de desamparo vem se aproximando e por um momento perco a referência de espaço, de tempo, por um instante me foge o sentido do que realmente estou fazendo ali e logo me vem a impressão de estar avançando por um subterrâneo sem fim e aí então surgem as lágrimas, tão perdido que me sinto, lágrimas certamente facilitadas pela fraqueza que causa o excesso de gim, e estas lágrimas de borbotões molham o cimento por onde me arrasto, mas aos poucos vou me acalmando, os pensamentos voltam a se ordenar e vou me recuperando deste encontro, uma pequena amostra do animal selvagem que se chama solidão, e na porta que dá acesso ao 18 vejo que há uma luz pálida, revelando que alguma boa alma deixou uma vela no patamar, o que dá uns ares trêmulos de terreiro à escadaria e isso me faz imaginar até o cheiro de eucalipto defumado e animado pela tênue claridade, posso acelerar um pouco o passo, e sigo um pouco neste beat, pois nos andares seguintes a configuração é parecida e quando chego ao 15, cruzo por dois moradores calvos, de idade indefinida, que sobem lentamente, eles vem conversando em tom de reza e não me dirigem o mínimo olhar e sinto alívio no 13 pois ali o número de velas é ainda maior, mas no 12 volta a escuridão total e meu ritmo diminui novamente, quando de repente escuto uma porta batendo e em seguida se lança um vulto muito rente a mim, saltando degraus de três em três, portando um poderoso facho de luz, um rapaz muito alto, muito magro, uma silhueta destas de história em quadrinhos que vai descendo vertiginosamente, deixando como rastro apenas o som dos passos vigorosos, portas se abrindo e se fechando com estrondo, e acompanho aquele ruído que vai se desvanecendo pouco a pouco e por sorte no 9 há velas novamente, há também música vinda de algum apartamento, há cheiro de temperos onde o manjericão predomina, há sinais de civilização que confortam, mas me irrito com a dedução de que se há gente cozinhando, estou fodido pois minha reunião era às dez e isto me faz voltar a acelerar o ritmo e no 7, as luzes de emergência estão funcionando e assim posso quase correr e quando chego ofegante à avenida vejo que a chuva não dá trégua e o tráfego se mostra estático e conformado. Me aproximo de um táxi vazio e a impressão que tenho é a de que o motor está desligado e o homem dorme ao volante. Entro afobadamente e isto parece fazê-lo despertar.
- Toca pro centro.
- Esquece rapaz. Deu no rádio que lacrou. Sem previsão.
- Como assim, lacrou?
- Eles tão dizendo que é o big bug que tá rolando. Não ouviu falar dessa treta?
- Não. Não sei o que é isso.
- Eles andam falando muito nessa parada, mano. Mas não sabia que era pra já. É muito carro, brother. Parou tudo. Inda mais essa chuva que tá batendo desde ontem de noite.
- E que horas você tem?
- É quase duas da tarde, bro.
Sem mais palavras, saio do veículo aos tropeções e entro na pastelaria logo em frente. Preciso botar algo urgente no estômago antes que desmaie. O boteco está lotado, mas consigo um bom lugar em um dos balcões. Espero o atendente e neste meio tempo, tento dar uma organizada no espírito. Perdi a reunião e perdi a la grande. Não tenho o menor ânimo para telefonar pedindo desculpas ou qualquer coisa do gênero. Sinto um desconforto sem medida, como se o dia estivesse fora do prumo. Parece que há uma desordem generalizada no ar, e logo me vem à cabeça a possibilidade do planeta ter saído de seu eixo durante a noite. Este é um dos grandes medos dos cientistas, que entediado tomei conhecimento assistindo a um destes programas bobos sobre apocalipse. O Big Bug da Terra, já diria o taxista. Saio do transe e reparo então que no balcão em frente, uma chinesa idosa me fita e sorri. Com a insistência desta atitude, me constranjo e lhe faço um sinal indagativo. Ela, sem desmanchar aquela máscara, com um tom de voz maquinal, diz alguma coisa a qual não consigo entender. Sinto então que alguém a meu lado toca meu braço e é um rapaz, também oriental que com a mesma espécie de sorriso na cara me fala num português estropiado.
- Você não entende, né? Ela disse que cê tá com cara de quem acordou com farelos na cama. É coisa do nosso povo. É coisa que se fala na China.
A sensação do dejavu que esta revelação me causa quase me faz perder o equilíbrio, e decidido a não mais enxergar pessoas, lutando contra a náusea, lanço meu olhar pela grande janela do estabelecimento e constato que a chuva continua caindo com a mesma intensidade. Vejo também que meu táxi está na mesmíssima posição e o perfil do motorista tem a boca aberta de quem ressona sem culpa. Não há som de buzinas nem de motores. Minha afta assovia e o torcicolo responde. Uma moça vem me atender e faço meu pedido com certa dificuldade, pois chegaram os malditos soluços.
OUTUBRO - 16 - pOa
- Toca pro centro.
- Esquece rapaz. Deu no rádio que lacrou. Sem previsão.
- Como assim, lacrou?
- Eles tão dizendo que é o big bug que tá rolando. Não ouviu falar dessa treta?
- Não. Não sei o que é isso.
- Eles andam falando muito nessa parada, mano. Mas não sabia que era pra já. É muito carro, brother. Parou tudo. Inda mais essa chuva que tá batendo desde ontem de noite.
- E que horas você tem?
- É quase duas da tarde, bro.
Sem mais palavras, saio do veículo aos tropeções e entro na pastelaria logo em frente. Preciso botar algo urgente no estômago antes que desmaie. O boteco está lotado, mas consigo um bom lugar em um dos balcões. Espero o atendente e neste meio tempo, tento dar uma organizada no espírito. Perdi a reunião e perdi a la grande. Não tenho o menor ânimo para telefonar pedindo desculpas ou qualquer coisa do gênero. Sinto um desconforto sem medida, como se o dia estivesse fora do prumo. Parece que há uma desordem generalizada no ar, e logo me vem à cabeça a possibilidade do planeta ter saído de seu eixo durante a noite. Este é um dos grandes medos dos cientistas, que entediado tomei conhecimento assistindo a um destes programas bobos sobre apocalipse. O Big Bug da Terra, já diria o taxista. Saio do transe e reparo então que no balcão em frente, uma chinesa idosa me fita e sorri. Com a insistência desta atitude, me constranjo e lhe faço um sinal indagativo. Ela, sem desmanchar aquela máscara, com um tom de voz maquinal, diz alguma coisa a qual não consigo entender. Sinto então que alguém a meu lado toca meu braço e é um rapaz, também oriental que com a mesma espécie de sorriso na cara me fala num português estropiado.
- Você não entende, né? Ela disse que cê tá com cara de quem acordou com farelos na cama. É coisa do nosso povo. É coisa que se fala na China.
A sensação do dejavu que esta revelação me causa quase me faz perder o equilíbrio, e decidido a não mais enxergar pessoas, lutando contra a náusea, lanço meu olhar pela grande janela do estabelecimento e constato que a chuva continua caindo com a mesma intensidade. Vejo também que meu táxi está na mesmíssima posição e o perfil do motorista tem a boca aberta de quem ressona sem culpa. Não há som de buzinas nem de motores. Minha afta assovia e o torcicolo responde. Uma moça vem me atender e faço meu pedido com certa dificuldade, pois chegaram os malditos soluços.
OUTUBRO - 16 - pOa
quinta-feira, 27 de outubro de 2016
O LIVRO PREDILETO
Dia destes participei de um sarau e o assunto principal era o livro predileto. Acabou que chegamos à conclusão que temos vários livros prediletos durante nossa vida.
Eu acho que o livro predileto sempre fica na principal sala de leitura da casa que é o banheiro.
Eu acho que o livro predileto sempre fica na principal sala de leitura da casa que é o banheiro.
Durante um bom tempo esteve em meu banheiro um livro chamado “A verdade sobre a morte de Adolph Hitler”. Não sei como foi parar lá. Só sei que li várias vezes. Os últimos momentos do Fhürer. Legal, né?
Lembro que ele ficava repousando em cima da máquina de lavar. Lembro também que destruí esta máquina pra matar um rato que entrou dentro dela. Foi uma das piores coisas que já fiz na minha vida. Matar um rato. Eu batia nele com um pau de vassoura e gritava com uma voz que definitivamente não era minha. Chegou num momento que ouvindo meu ridículo e involuntário escândalo pensei; “Bah, sou bicha e não sabia”. Putz, e além disso, tô aqui revelando pra todo mundo minha antiga pobreza. Máquina de lavar no banheiro. É mole? Mas agora, posso dizer que melhorei. A máquina tá lá no quarto.
Tempo depois, meu banheiro abrigava o “Cem anos de solidão” de GGM, que li duas vezes inteiras e depois fragmentos. Paguei o mico, mais de uma vez, de ler durante tanto tempo que minhas pernas ficavam dormentes e assim me via obrigado a gritar por socorro. Então minha mulher tinha de pedir ajuda à vizinha, Dona Mildred, pra conseguir me tirar dali. Depois que as duas me depositavam sobre o sofá da sala, iam conversando até a porta de saída e a velha sempre comentava com voz de dubladora de filmes;
- Como ele gosta de ler, não é?
Depois de fazer mais algum comentário vago sobre a beleza das petúnias da estação ou o quanto as bergamotas estavam saborosas nesta época do ano, se ia.
Voltando a GGMarquez, foi com ele que descobri a beleza do parágrafo, a beleza da frase, a beleza da forma, e foi através dele que cheguei até meu escritor favorito, Julio Cortazar.
Foi com Cortazar que descobri que literatura pode dar gosto na boca. Lendo Julio, me vem uma rara sensação de deformidade de tempo e espaço e assim começo a desconfiar que a literatura pode ser mais musical que a própria música, porque Cortazar é melodia e é ritmo também. Dia destes, procurando na Internet, descobri que o escritor argentino padeceu de uma grave enfermidade na sua adolescência que o deixou vários meses no leito. Ele relata, nesta matéria, que durante esta época em que esteve acamado, sentia uma deformidade no tempo e no espaço. Fiquei assombrado ao ler isto.
Por aí também li que certa feita Julio foi questionado por um jornalista que lhe perguntou por que nunca havia feito uma literatura mais engajada politicamente. Julio respondeu que se isto tivesse acontecido teria sido uma traição ao povo argentino. Eu penso da mesma forma. Acredito que a maior contribuição que Chico Buarque deu ao país não foram suas criativas canções de protesto feitas na época da ditadura, e sim o apuro que sempre teve com suas letras, harmonias e melodias, estimulando assim nossa sensibilidade, nosso senso estético, cutucando nossa “inteligência”. É necessário que se tenha sensibilidade apurada para entender o atual momento político e nos livrarmos de julgamentos rasos. É preciso ter faróis especiais no meio de tanta neblina. Só uma cultura rica pode nos dar as ferramentas necessárias para enxergar bem neste mar revolto. Julio e Chico são gigantes da humanidade.
Agora, no meu banheiro estava a obra do gauchão Nietzsche. Que? Olha o fim do nome. Não é gaúcho? Bueno. O livro tem um prólogo que dá uma pista de sobre o que o livro versará. Na real tanto faz como tanto fez, porque afinal de contas devemos confessar com vergonha que entendemos porra nenhuma. E olha que já fui bravo. Li “os Irmãos Karamazov” e “O Jogo da Amarelinha” que são bem difíceis. Aquele leitor era um outro eu. Atualmente não consigo ler uma página inteira sem que meu pensamento fuja e este livro de que vos falo, deste filósofo maluquézimo, é osso duríssimo de roer.
Lembro que ele ficava repousando em cima da máquina de lavar. Lembro também que destruí esta máquina pra matar um rato que entrou dentro dela. Foi uma das piores coisas que já fiz na minha vida. Matar um rato. Eu batia nele com um pau de vassoura e gritava com uma voz que definitivamente não era minha. Chegou num momento que ouvindo meu ridículo e involuntário escândalo pensei; “Bah, sou bicha e não sabia”. Putz, e além disso, tô aqui revelando pra todo mundo minha antiga pobreza. Máquina de lavar no banheiro. É mole? Mas agora, posso dizer que melhorei. A máquina tá lá no quarto.
Tempo depois, meu banheiro abrigava o “Cem anos de solidão” de GGM, que li duas vezes inteiras e depois fragmentos. Paguei o mico, mais de uma vez, de ler durante tanto tempo que minhas pernas ficavam dormentes e assim me via obrigado a gritar por socorro. Então minha mulher tinha de pedir ajuda à vizinha, Dona Mildred, pra conseguir me tirar dali. Depois que as duas me depositavam sobre o sofá da sala, iam conversando até a porta de saída e a velha sempre comentava com voz de dubladora de filmes;
- Como ele gosta de ler, não é?
Depois de fazer mais algum comentário vago sobre a beleza das petúnias da estação ou o quanto as bergamotas estavam saborosas nesta época do ano, se ia.
Voltando a GGMarquez, foi com ele que descobri a beleza do parágrafo, a beleza da frase, a beleza da forma, e foi através dele que cheguei até meu escritor favorito, Julio Cortazar.
Foi com Cortazar que descobri que literatura pode dar gosto na boca. Lendo Julio, me vem uma rara sensação de deformidade de tempo e espaço e assim começo a desconfiar que a literatura pode ser mais musical que a própria música, porque Cortazar é melodia e é ritmo também. Dia destes, procurando na Internet, descobri que o escritor argentino padeceu de uma grave enfermidade na sua adolescência que o deixou vários meses no leito. Ele relata, nesta matéria, que durante esta época em que esteve acamado, sentia uma deformidade no tempo e no espaço. Fiquei assombrado ao ler isto.
Por aí também li que certa feita Julio foi questionado por um jornalista que lhe perguntou por que nunca havia feito uma literatura mais engajada politicamente. Julio respondeu que se isto tivesse acontecido teria sido uma traição ao povo argentino. Eu penso da mesma forma. Acredito que a maior contribuição que Chico Buarque deu ao país não foram suas criativas canções de protesto feitas na época da ditadura, e sim o apuro que sempre teve com suas letras, harmonias e melodias, estimulando assim nossa sensibilidade, nosso senso estético, cutucando nossa “inteligência”. É necessário que se tenha sensibilidade apurada para entender o atual momento político e nos livrarmos de julgamentos rasos. É preciso ter faróis especiais no meio de tanta neblina. Só uma cultura rica pode nos dar as ferramentas necessárias para enxergar bem neste mar revolto. Julio e Chico são gigantes da humanidade.
Agora, no meu banheiro estava a obra do gauchão Nietzsche. Que? Olha o fim do nome. Não é gaúcho? Bueno. O livro tem um prólogo que dá uma pista de sobre o que o livro versará. Na real tanto faz como tanto fez, porque afinal de contas devemos confessar com vergonha que entendemos porra nenhuma. E olha que já fui bravo. Li “os Irmãos Karamazov” e “O Jogo da Amarelinha” que são bem difíceis. Aquele leitor era um outro eu. Atualmente não consigo ler uma página inteira sem que meu pensamento fuja e este livro de que vos falo, deste filósofo maluquézimo, é osso duríssimo de roer.
Mas lhes conto que ele tava lá no bidê. Ficava lá, só me olhando... Já o deixei e peguei de novo várias vezes pra dar mais uma tenteada. Lhes digo também que todos os capítulos, que são geralmente de duas páginas e meia, terminam com a frase que dá título à obra. “Assim falou Zarathustra”. Pois bem. Quando lia este fechamento, marcava a folha com melancolia, colocava a mão no queixo e pensava cá comigo: ”E assim nada entendeu Corona”. Constantemente me irrito e jogo o opúsculo na parede. Dia destes, ricocheteou mal e caiu dentro do vaso.
Parius.
Bueno de novo.
Não jogo nada fora.
Então, quando chego na área, vejo ele pendurado no varal, pegando uma aragem...
fica lá...só me olhando.
Parius.
Bueno de novo.
Não jogo nada fora.
Então, quando chego na área, vejo ele pendurado no varal, pegando uma aragem...
fica lá...só me olhando.
segunda-feira, 24 de outubro de 2016
TÁ! MAS SÓ HOJE.
Estavam quase nus quando ele olhou pra ela e falou.
- Você é linda. Vou te comer todinha.
- Não vai não.
- Não?
- Não.
- Por?
- Vai te catar. Esta é uma expressão insuportavelmente machista. Me trata como uma coisa. Além do mais, na prática, se tem alguém que come alguém, este alguém é a mulher.
- Sabe o que é? É que você é muito gostosa.
- Óh!... de novo!
- Óh de novo o que?
- Me tratando como objeto. Gostosa como um peito de peru? Uma mortadela?
- Tá bom. Não se repetirá.
Voltaram então aos beijos frenéticos e num determinado momento ele murmurou;
- Que tesão.
Ela se afastou toda empertigada, e com ares de inquisição mandou;
- Tesão porque sou gostosa?
Ele fez uma breve pausa antes de dar a resposta vacilante.
- Não. ..que é isso. Nem pense numa coisa dessas. Tesão de tesão. Tesão normal. Desses que a gente tá parado, tranquilo, e de repente, de uma hora pra outra, vem e dá um tesão na gente.
Foi falando isso e ao mesmo tempo livrando a menina do soutien. Quando as turbinas do Senhor se revelaram, lhe vieram lágrimas aos olhos e não conseguiu evitar uma exclamação aos céus:
- Aiaiai!
- O que é isso?
- O que é isso o quê?
- Tá gemendo desse jeito porque me achou gostosa?
- Não, não...foi o ciático que me atacou um tiquinho.
- Ah bom.
Ele voltou mirar aqueles peitos e balbuciou em tom de reza.
- Os venusianos invadirão nosso planeta para confiscar nosso arsenal de luxúrias e pecados de batina.
- Que maluquice é essa?
- Sei lá. Tô vendo se falo algo que você não censure.
- Mas você precisa falar todo o tempo? Não consegue ficar nem um pouquinho em silêncio? Até parece uma mulherzinha gasguita!
- Opa, opa, opa! Você é machista.
- Sou não!
- É sim. Tá dizendo que eu pareço uma mulherzinha. Machismo puro, minha querida! Eu bem que desconfiei no momento em que chegou a conta no restaurante e você nem olhou pra bolsa. Ainda por cima ficou assoviando uma do Roberto enquanto eu passava o cartão. Você é machista!
- Grosso que você é. Olha só! Só nós, as mulheres, é que podemos dizer o que é machismo e o que não é machismo.
- É?
- É sim. A humanidade nos deve isso.
- Tá bom, tá bom. Mas vamos voltar a nosso assunto aqui. Escuta só. Prestatenção! Agora vou te comer todinha porque você é gostosa e tô com o maior tesão.
- Vai comer não.
- Vou sim.
- Não!
- Vou.
- Tá.
- Tá?
- Tá...mas só hoje.
- Você é linda. Vou te comer todinha.
- Não vai não.
- Não?
- Não.
- Por?
- Vai te catar. Esta é uma expressão insuportavelmente machista. Me trata como uma coisa. Além do mais, na prática, se tem alguém que come alguém, este alguém é a mulher.
- Sabe o que é? É que você é muito gostosa.
- Óh!... de novo!
- Óh de novo o que?
- Me tratando como objeto. Gostosa como um peito de peru? Uma mortadela?
- Tá bom. Não se repetirá.
Voltaram então aos beijos frenéticos e num determinado momento ele murmurou;
- Que tesão.
Ela se afastou toda empertigada, e com ares de inquisição mandou;
- Tesão porque sou gostosa?
Ele fez uma breve pausa antes de dar a resposta vacilante.
- Não. ..que é isso. Nem pense numa coisa dessas. Tesão de tesão. Tesão normal. Desses que a gente tá parado, tranquilo, e de repente, de uma hora pra outra, vem e dá um tesão na gente.
Foi falando isso e ao mesmo tempo livrando a menina do soutien. Quando as turbinas do Senhor se revelaram, lhe vieram lágrimas aos olhos e não conseguiu evitar uma exclamação aos céus:
- Aiaiai!
- O que é isso?
- O que é isso o quê?
- Tá gemendo desse jeito porque me achou gostosa?
- Não, não...foi o ciático que me atacou um tiquinho.
- Ah bom.
Ele voltou mirar aqueles peitos e balbuciou em tom de reza.
- Os venusianos invadirão nosso planeta para confiscar nosso arsenal de luxúrias e pecados de batina.
- Que maluquice é essa?
- Sei lá. Tô vendo se falo algo que você não censure.
- Mas você precisa falar todo o tempo? Não consegue ficar nem um pouquinho em silêncio? Até parece uma mulherzinha gasguita!
- Opa, opa, opa! Você é machista.
- Sou não!
- É sim. Tá dizendo que eu pareço uma mulherzinha. Machismo puro, minha querida! Eu bem que desconfiei no momento em que chegou a conta no restaurante e você nem olhou pra bolsa. Ainda por cima ficou assoviando uma do Roberto enquanto eu passava o cartão. Você é machista!
- Grosso que você é. Olha só! Só nós, as mulheres, é que podemos dizer o que é machismo e o que não é machismo.
- É?
- É sim. A humanidade nos deve isso.
- Tá bom, tá bom. Mas vamos voltar a nosso assunto aqui. Escuta só. Prestatenção! Agora vou te comer todinha porque você é gostosa e tô com o maior tesão.
- Vai comer não.
- Vou sim.
- Não!
- Vou.
- Tá.
- Tá?
- Tá...mas só hoje.
sábado, 15 de outubro de 2016
PELO DIA DO PROFESSOR
Miriam Leitão, da Globo Golpista, dia destes, numa entrevista com o ministro da deseducação, que nem sei o nome, falou uma bobagem despropositada.
Num determinado momento, ela diz que professor não deveria se aposentar nunca, pois quanto mais tempo passa, mais sábio fica.
Quis fazer uma espécie de homenagem, num momento em que o tema aposentadoria vai ficando cada vez mais delicado. Foi desajeitada em sua alienação coxo golpista purpurinada globotomizadora.
Ela não deve saber, apesar de ser uma jornalista, a quantidade de professores que estão afastados do magistério por todo tipo de problema de saúde.
Principalmente na rede pública.
Ela não tem ideia de que professor, na grande maioria das vezes, pra sobreviver porque o salário é ruim, tem de escolher um carga horária gigante. Soma-se ainda a falta de condições básicas, material, equipamentos, ventiladores e ar condicionado. Tem muito professor que tira do próprio bolso pra poder dar aula de uma forma um pouco mais decente.
E este ministro com cara de tatu ainda diz que as “regalias dos professores têm de acabar.”
Esta jornalista foi muito babaca. Cínica, hipócrita. Perversa. Mídia canalha. Cúmplice de um governo canalha.
Professor precisa urgente de férias, precisa aposentadoria. Professor precisa respeito. Professor brasileiro tá precisando de solidariedade.
Conheço muitos professores de perto e é de perto que conheço o drama.
Um grande abraço no professor brasileiro que na verdade tá precisando mesmo é de colo.
Num determinado momento, ela diz que professor não deveria se aposentar nunca, pois quanto mais tempo passa, mais sábio fica.
Quis fazer uma espécie de homenagem, num momento em que o tema aposentadoria vai ficando cada vez mais delicado. Foi desajeitada em sua alienação coxo golpista purpurinada globotomizadora.
Ela não deve saber, apesar de ser uma jornalista, a quantidade de professores que estão afastados do magistério por todo tipo de problema de saúde.
Principalmente na rede pública.
Ela não tem ideia de que professor, na grande maioria das vezes, pra sobreviver porque o salário é ruim, tem de escolher um carga horária gigante. Soma-se ainda a falta de condições básicas, material, equipamentos, ventiladores e ar condicionado. Tem muito professor que tira do próprio bolso pra poder dar aula de uma forma um pouco mais decente.
E este ministro com cara de tatu ainda diz que as “regalias dos professores têm de acabar.”
Esta jornalista foi muito babaca. Cínica, hipócrita. Perversa. Mídia canalha. Cúmplice de um governo canalha.
Professor precisa urgente de férias, precisa aposentadoria. Professor precisa respeito. Professor brasileiro tá precisando de solidariedade.
Conheço muitos professores de perto e é de perto que conheço o drama.
Um grande abraço no professor brasileiro que na verdade tá precisando mesmo é de colo.
segunda-feira, 10 de outubro de 2016
A FANTÁSTICA HISTÓRIA DE UMA PARCERIA
Foi na semana passada que entreguei uma melodia a um colega pra ver se ele se inspirava e colocava alguma letra em cima. Passados alguns dias ele me liga para comunicar que havia terminado o trabalho e queria me mostrar o resultado da composição.
Marcamos num bar e estranhei o fato dele trazer apenas uma pastinha debaixo do braço. Depois das saudações, sentamos, gritamos por dois chopes escarlates, e ele então pediu desculpas por não portar o violão e comentou que por estes dias andava numa correria bárbara, mas apesar do tempo tão exíguo, se sentia bastante satisfeito com o rumo que havia tomado nossa criação. Com um sorriso enigmático, abriu a pasta, retirou de dentro algumas folhas impressas, e tomado por uns ares de quem está prestes a ter sua genialidade por fim descoberta, entregou-as a mim.
Percebi, de antemão, que a fonte era Tempus Sans, que muito me agrada, e ele havia utilizado letras graúdas, generosas, para redigir o impresso que parecia muito claro em sua apresentação.
No momento em que se revelou o título da canção, deixei escapar uma pequena interjeição de agrado, pois aquilo me pareceu deveras interessante e talvez este gesto tenha feito meu amigo sorver o chope mais ruidosamente do que era de seu costume ao mesmo tempo em que acompanhava meus movimentos com olhos de uma feliz e incontida expectativa;
- Sapo Cururu?
- Isto mesmo. Sapo Cururu.
Li em voz alta e pausada a primeira estrofe.
- Sapo Cururu,
na beira do rio,
quando o sapo canta,
ó maninha,
é porque tem frio.
Levantei os olhos do papel, pois pressenti que meu amigo, limpando com a manga do paletó o bigode rubro, fazia uma clara menção de que começaria a explanar.
- Sabe o que é? O sapo aqui do sul, o batrákio gaudérius, nesta época do ano onde há muito frio e umidade nos fins de tarde, sofre uma brusca mudança em seu metabolismo e isto faz com que ele sinta um frio terrível. Neste momento, por uma defesa natural, ele começa a coaxar e como está sempre junto ao grupo, logo forma-se o que se poderia chamar de o grande coral.
- Sim. Continue.
- O som resultante de centenas, talvez até milhares de bocas de sapo cantando ao mesmo tempo, cria uma frequência que atinge diretamente o córtex do animalzinho, e isto ativa uma enzima que triplica o fornecimento de adrenalina no corpo dele e assim o sangue passa a circular com mais velocidade fazendo o sapo voltar a ficar aquecidinho.
Ouvindo tal magnífica explicação, assombrado, bebi quase todo meu chope com goles brutais, e semi engasgado murmurei.
- Sério?
- Sim. Pesquisei e tudo.
- Beleza. Agora me diz uma coisa. E a maninha?
- A maninha é a cunhada.
Neste instante, o rosto de meu colega se iluminou com centelhas de luxúria, pois a palavra “cunhada” é um botão que sempre faz com que se acendam luzes de todos os matizes e por todos os recantos.
- O sapo tem cunhada?
- Claro.
- Então o sapo é casado.
- Não neste caso. Ou melhor; não ainda como você vai ver na continuação. Saiba você que os sapos daqui do sul se casam também com as irmãs da sapa.
- Isso aí tu tá inventando.
- Nada. Assisti a uma longa e séria matéria no National Geographic.
- Bueno. Legal.
Depois de pedir mais dois chopes e um prato de linguiças carameladas, passei então a ler a segunda estrofe.
- A mulher do sapo,
deve estar lá dentro,
fazendo rendinha,
ó maninha,
pro seu casamento.
Esta estrofe me incomodou um pouco. Depois de agradecer ao garçom pela celeridade com que foi feita a entrega das linguiças, sem perda de tempo mergulhei a minha na farinha de guaco orgânico e inquiri.
- Esta estrofe não seria um tanto machista? Por que a mulher do sapo tem de trabalhar?
-Ahaha! Sabia que você ia perguntar isto. Pesquisei também. O casamento do sapo se realiza sempre no findar da tarde e esta é a única ocasião em que o bando tem de manter silêncio. É uma ordem da natureza. O sapo não pode cantar nos casamentos, de jeito nenhum.
Meu amigo então falou mais algumas palavras incompreensíveis, pois a linguiça queimava sua boca. Tratei então de ajuda-lo.
- Vamos ver se entendi. Como o sapo sempre sente frio ao entardecer e durante o casamento ele não pode cantar e é quando canta que se mantém quentinho, a solução para o problema tem de ser outra.
- Humhum.
Percebi que a linguiça fervente dava pequenos estalidos e se podiam ver fagulhas coloridas nas profundezas da boca sorridente e encaramelizada de meu parceiro. Observando que sua impossibilidade continuava, prossegui.
- Então a mulher do sapo tece agasalhos de rendinha pra suprir esta momentânea falha do metabolismo. Ela fabrica sueterzinhos pra ela, pro futuro marido e quiçá pra irmã, ou irmãs, sei lá. É isto?
- Perfeitamente.
No calor da emoção resolvemos brindar, mas quando as taças se tocaram, o chope incandesceu, e por mais presteza que tenhamos empregado na tentativa de levar os copos à boca, não conseguimos evitar que a espuma rósea se espalhasse em abundância por nossa mesa e atingisse inclusive a algumas mesas vizinhas. Enquanto dois garçons faziam a providencial limpeza do ambiente com grandes toalhas de linho, conjeturei que estávamos compondo um novo clássico da música popular brasileira, me senti orgulhoso de possuir um parceiro que seria um novo Benjor, criativo em suas letras carregadas de insanidade folclórica, o non sense inquestionável, as palavras escolhidas numa ordem irreversível, a continuidade exata e mais do que perfeita. Quando os garçons se retiraram, sem perda de tempo voltei à leitura dos versos, usando desta feita uma voz um tanto empostada, pois a bebida já ordenava seus brilhos de etilia por minhas veias impuras.
- A mulher do sapo,
não lambe o pé do sapo,
porque o sapo não lava o pé
e não lava o pé porque não quer.
Neste momento abocanhei o derradeiro pedaço de linguiça que ainda espocava e observei com atenção meu amigo cuspir uma nova sentença de sílabas acentuadamente separadas.
- Es tá com pro va do!
- O que?, lhe perguntei animado.
- O sapo, apesar de ser um animal exclusivamente hídrico, possui péssimos hábitos de higiene.
- Por isto a mulher do sapo se nega a lamber seu pé?
- Bingo!
- E a cunhada?
- A cunhada muito menos. Você sabe como as cunhadas são cheias de mimimi.
- Isto não é legal.
- É verdade. Mas todo o resto rola.
- Ah bom.
- Lê a última. Acho que fechei com chave de ouro.
Depois de conseguir eliminar os excessos de caramelo das gengivas iniciei a leitura da derradeira e mais extensa estrofe.
Aumentei bem o volume da voz, para que as pessoas das mesas adjacentes também pudessem usufruir daquilo que para mim, sem sombra de dúvida, se anunciava como notabilíssima obra maestra.
- Sapo Cururú,
vai na festa do céu,
ao contrário do jacaré,
que não pode entrar,
mas não pense que é pela boca grande,
o jacaré não entra no céu nem com capuz,
pois por ter o braço curto,
não consegue fazer o sinal da cruz.
Quando terminei o verso, observei que havia um respeitoso silêncio por todo o bar. As pessoas entenderam a importância de tudo aquilo. Meu parceiro estava com lágrimas nos olhos e tomados por uma sensação de extremo regozijo, esquecendo do anterior desastre, repetimos o brinde irresponsavelmente e entre gritos e impropérios, cada qual tentando se proteger da espuma indomável que a tudo invadia, nos abraçamos, e possuídos por um formidável espírito artístico, esquecidos do mundo que nos rodeava, entoamos a melodia a todos pulmões, tentando decifrar as palavras que ainda restavam naqueles papeis irremediavelmente encharcados de chope escarlate.
Marcamos num bar e estranhei o fato dele trazer apenas uma pastinha debaixo do braço. Depois das saudações, sentamos, gritamos por dois chopes escarlates, e ele então pediu desculpas por não portar o violão e comentou que por estes dias andava numa correria bárbara, mas apesar do tempo tão exíguo, se sentia bastante satisfeito com o rumo que havia tomado nossa criação. Com um sorriso enigmático, abriu a pasta, retirou de dentro algumas folhas impressas, e tomado por uns ares de quem está prestes a ter sua genialidade por fim descoberta, entregou-as a mim.
Percebi, de antemão, que a fonte era Tempus Sans, que muito me agrada, e ele havia utilizado letras graúdas, generosas, para redigir o impresso que parecia muito claro em sua apresentação.
No momento em que se revelou o título da canção, deixei escapar uma pequena interjeição de agrado, pois aquilo me pareceu deveras interessante e talvez este gesto tenha feito meu amigo sorver o chope mais ruidosamente do que era de seu costume ao mesmo tempo em que acompanhava meus movimentos com olhos de uma feliz e incontida expectativa;
- Sapo Cururu?
- Isto mesmo. Sapo Cururu.
Li em voz alta e pausada a primeira estrofe.
- Sapo Cururu,
na beira do rio,
quando o sapo canta,
ó maninha,
é porque tem frio.
Levantei os olhos do papel, pois pressenti que meu amigo, limpando com a manga do paletó o bigode rubro, fazia uma clara menção de que começaria a explanar.
- Sabe o que é? O sapo aqui do sul, o batrákio gaudérius, nesta época do ano onde há muito frio e umidade nos fins de tarde, sofre uma brusca mudança em seu metabolismo e isto faz com que ele sinta um frio terrível. Neste momento, por uma defesa natural, ele começa a coaxar e como está sempre junto ao grupo, logo forma-se o que se poderia chamar de o grande coral.
- Sim. Continue.
- O som resultante de centenas, talvez até milhares de bocas de sapo cantando ao mesmo tempo, cria uma frequência que atinge diretamente o córtex do animalzinho, e isto ativa uma enzima que triplica o fornecimento de adrenalina no corpo dele e assim o sangue passa a circular com mais velocidade fazendo o sapo voltar a ficar aquecidinho.
Ouvindo tal magnífica explicação, assombrado, bebi quase todo meu chope com goles brutais, e semi engasgado murmurei.
- Sério?
- Sim. Pesquisei e tudo.
- Beleza. Agora me diz uma coisa. E a maninha?
- A maninha é a cunhada.
Neste instante, o rosto de meu colega se iluminou com centelhas de luxúria, pois a palavra “cunhada” é um botão que sempre faz com que se acendam luzes de todos os matizes e por todos os recantos.
- O sapo tem cunhada?
- Claro.
- Então o sapo é casado.
- Não neste caso. Ou melhor; não ainda como você vai ver na continuação. Saiba você que os sapos daqui do sul se casam também com as irmãs da sapa.
- Isso aí tu tá inventando.
- Nada. Assisti a uma longa e séria matéria no National Geographic.
- Bueno. Legal.
Depois de pedir mais dois chopes e um prato de linguiças carameladas, passei então a ler a segunda estrofe.
- A mulher do sapo,
deve estar lá dentro,
fazendo rendinha,
ó maninha,
pro seu casamento.
Esta estrofe me incomodou um pouco. Depois de agradecer ao garçom pela celeridade com que foi feita a entrega das linguiças, sem perda de tempo mergulhei a minha na farinha de guaco orgânico e inquiri.
- Esta estrofe não seria um tanto machista? Por que a mulher do sapo tem de trabalhar?
-Ahaha! Sabia que você ia perguntar isto. Pesquisei também. O casamento do sapo se realiza sempre no findar da tarde e esta é a única ocasião em que o bando tem de manter silêncio. É uma ordem da natureza. O sapo não pode cantar nos casamentos, de jeito nenhum.
Meu amigo então falou mais algumas palavras incompreensíveis, pois a linguiça queimava sua boca. Tratei então de ajuda-lo.
- Vamos ver se entendi. Como o sapo sempre sente frio ao entardecer e durante o casamento ele não pode cantar e é quando canta que se mantém quentinho, a solução para o problema tem de ser outra.
- Humhum.
Percebi que a linguiça fervente dava pequenos estalidos e se podiam ver fagulhas coloridas nas profundezas da boca sorridente e encaramelizada de meu parceiro. Observando que sua impossibilidade continuava, prossegui.
- Então a mulher do sapo tece agasalhos de rendinha pra suprir esta momentânea falha do metabolismo. Ela fabrica sueterzinhos pra ela, pro futuro marido e quiçá pra irmã, ou irmãs, sei lá. É isto?
- Perfeitamente.
No calor da emoção resolvemos brindar, mas quando as taças se tocaram, o chope incandesceu, e por mais presteza que tenhamos empregado na tentativa de levar os copos à boca, não conseguimos evitar que a espuma rósea se espalhasse em abundância por nossa mesa e atingisse inclusive a algumas mesas vizinhas. Enquanto dois garçons faziam a providencial limpeza do ambiente com grandes toalhas de linho, conjeturei que estávamos compondo um novo clássico da música popular brasileira, me senti orgulhoso de possuir um parceiro que seria um novo Benjor, criativo em suas letras carregadas de insanidade folclórica, o non sense inquestionável, as palavras escolhidas numa ordem irreversível, a continuidade exata e mais do que perfeita. Quando os garçons se retiraram, sem perda de tempo voltei à leitura dos versos, usando desta feita uma voz um tanto empostada, pois a bebida já ordenava seus brilhos de etilia por minhas veias impuras.
- A mulher do sapo,
não lambe o pé do sapo,
porque o sapo não lava o pé
e não lava o pé porque não quer.
Neste momento abocanhei o derradeiro pedaço de linguiça que ainda espocava e observei com atenção meu amigo cuspir uma nova sentença de sílabas acentuadamente separadas.
- Es tá com pro va do!
- O que?, lhe perguntei animado.
- O sapo, apesar de ser um animal exclusivamente hídrico, possui péssimos hábitos de higiene.
- Por isto a mulher do sapo se nega a lamber seu pé?
- Bingo!
- E a cunhada?
- A cunhada muito menos. Você sabe como as cunhadas são cheias de mimimi.
- Isto não é legal.
- É verdade. Mas todo o resto rola.
- Ah bom.
- Lê a última. Acho que fechei com chave de ouro.
Depois de conseguir eliminar os excessos de caramelo das gengivas iniciei a leitura da derradeira e mais extensa estrofe.
Aumentei bem o volume da voz, para que as pessoas das mesas adjacentes também pudessem usufruir daquilo que para mim, sem sombra de dúvida, se anunciava como notabilíssima obra maestra.
- Sapo Cururú,
vai na festa do céu,
ao contrário do jacaré,
que não pode entrar,
mas não pense que é pela boca grande,
o jacaré não entra no céu nem com capuz,
pois por ter o braço curto,
não consegue fazer o sinal da cruz.
Quando terminei o verso, observei que havia um respeitoso silêncio por todo o bar. As pessoas entenderam a importância de tudo aquilo. Meu parceiro estava com lágrimas nos olhos e tomados por uma sensação de extremo regozijo, esquecendo do anterior desastre, repetimos o brinde irresponsavelmente e entre gritos e impropérios, cada qual tentando se proteger da espuma indomável que a tudo invadia, nos abraçamos, e possuídos por um formidável espírito artístico, esquecidos do mundo que nos rodeava, entoamos a melodia a todos pulmões, tentando decifrar as palavras que ainda restavam naqueles papeis irremediavelmente encharcados de chope escarlate.
segunda-feira, 3 de outubro de 2016
MORTE OU LALALA?
Aqui em Porto Alegre, ter de escolher entre Mello e Marchesan é mais ou menos a mesma coisa que escolher entre morte ou Lalala.
Não sabe o que é Lalala?
Prestenção!
Dois caras que estavam participando de um safari foram capturados por uma tribo africana, com justa razão, pois estavam abatendo animais.
Estavam os dois amarrados no centro da taba quando se aproxima o líder dos selvagens, um gordo de dois metros de altura, que comunica com voz de trovão a um dos caçadores;
- Tu, que é invasor, tem duas opção. Morte ou Lalala. Que que tu qué?
Este responde sem pestanejar.
– Escolho Lalala.
Os selvagens então começam a gritar de alegria, desamarram o cara, botam ele de quatro no areião e os 50 mais pauzudos silvícolas fazem fila e comem brutalmente o cara durante mais de duas horas. Era nisso que consistia o Lalala.
Quando termina a função, o arrombado semi morto é liberado com muitos agradecimentos e exclamações de satisfação por parte dos selvagens.
Então o chefão se aproxima do segundo e faz a mesma proposta.
- Agora tu! Morte ou Lalala!!!??
O cara, que havia assistido àquela bárbara tortura pela qual o amigo tinha passado, responde firme e corajosamente.
– Quero morte.
Cria-se um repentino silêncio por toda a tribo e os olhares de expectativa se voltam para o chefe, o gigante, que com a fisionomia tomada por um misto de luxúria e desapontamento, balbucia entre dentes.
– Tá bom.....morte.
Mas logo seu rosto volta a iluminar-se no momento em que grita a todos pulmões.
– Mas antes Lalalaaa!!!!!!!!!
Não sabe o que é Lalala?
Prestenção!
Dois caras que estavam participando de um safari foram capturados por uma tribo africana, com justa razão, pois estavam abatendo animais.
Estavam os dois amarrados no centro da taba quando se aproxima o líder dos selvagens, um gordo de dois metros de altura, que comunica com voz de trovão a um dos caçadores;
- Tu, que é invasor, tem duas opção. Morte ou Lalala. Que que tu qué?
Este responde sem pestanejar.
– Escolho Lalala.
Os selvagens então começam a gritar de alegria, desamarram o cara, botam ele de quatro no areião e os 50 mais pauzudos silvícolas fazem fila e comem brutalmente o cara durante mais de duas horas. Era nisso que consistia o Lalala.
Quando termina a função, o arrombado semi morto é liberado com muitos agradecimentos e exclamações de satisfação por parte dos selvagens.
Então o chefão se aproxima do segundo e faz a mesma proposta.
- Agora tu! Morte ou Lalala!!!??
O cara, que havia assistido àquela bárbara tortura pela qual o amigo tinha passado, responde firme e corajosamente.
– Quero morte.
Cria-se um repentino silêncio por toda a tribo e os olhares de expectativa se voltam para o chefe, o gigante, que com a fisionomia tomada por um misto de luxúria e desapontamento, balbucia entre dentes.
– Tá bom.....morte.
Mas logo seu rosto volta a iluminar-se no momento em que grita a todos pulmões.
– Mas antes Lalalaaa!!!!!!!!!
quarta-feira, 28 de setembro de 2016
PREVISÃO POLÍTICA PARA UM FUTURO NEM TÃO REMOTO
Estamos em 2030.
O Presidente da República, Sergio Moro, PJR (PARTIDO DOS JUÍZES ROBOCÓPS) que tem como vice William Waack, PLN (PARTIDO DOS LOCUTORES NAZISTAS) está sofrendo processo de impitiman, movido por Aécio Neves, PCEP (PARTIDO DOS CANDIDATOS ETERNAMENTE PERDEDORES).
O Juiz encarregado do processo é Luiz Inácio Lula da Silva, que no ano de 2016, pegou cana pelo famoso escândalo dos pedalinhos contrabandeados da Venezuela (foi o que eles conseguiram na época).
Luiz Inácio estudou direito no presídio, se concursou aos 85 anos e pediu o afastamento do presidente Moro, não por corrupção ou qualquer outra ilicitude, mas sim pelo fato deste, em meio a seu mandato, ter aceito um convite para encarnar Salomão Hayala na oitava versão da novela O ASTRO.
O país, em meio a terríveis rusgas e combates travados entre Coxalhas (os que usam camisetas cor fúcsia) e Petrinhas(os que saem às ruas vestindo magenta), espera assombrado pelo desenlace da questão.
É importante relatar que sendo fúcsia e magenta cores muito parecidas, os manifestantes nunca têm certeza de estar espancando da forma mais correta.
Zé Dirceu, em sua primeira permissão de liberdade condicional, fez uma nova operação plástica, e ficou igualzinho ao Serra. Com isso, nunca mais teve problemas com a justiça, a não ser a peleia nos tribunais que os dois tem entre si para tentar provar quem é o verdadeiro. Toda vez que se encontram no júri, se moem a pancada.
Dilma, depois de ter sido defenestrada sem provas pela legião de piratas do congresso, deixou de vez a política, para se livrar definitivamente de tantos malas. Atualmente dirige um curso de oratória que parece não ir muito bem das pernas.
Seu vice, Michel Temer, depois do vazamento de uma fotografia em que aparecia pelado portando a faixa presidencial, renunciou estrepitosamente. Comenta-se que quem propagou a foto foi o jardineiro da mansão e até hoje não se sabe ao certo se este homem mantinha um relacionamento secreto com a bela e recatada ou com o próprio traíra.
E o Cunha?
Cunha fundou o PLI, (PARTIDO DOS LARÁPIOS IMPUNES) do qual é o presidente. Com justa razão, afinal de contas, Dudu é o mais larápio e o mais impune.
Ministro da Economia do Morocóp, acredita?
E quem mais teria tanta intimidade com tão imensas cifras?
segunda-feira, 26 de setembro de 2016
LEGIÃO DE IDIOTAS
Vivi na Espanha na década de 80. Uma das coisas que me vem à mente é que eu achava esquisita a maneira como uma boa parte dos turistas brasileiros se portava por aquelas bandas. Naquele tempo eu fugia do contato com turistas de nosso país. Tinha um pouco de vergonha deles.
Eu não entendia aquelas maneiras brasileiras de falar alto pra ser notado. Ficava me perguntando o porquê de nos acharmos tão especiais. Além disso, eu sentia que os brasileiros demonstravam um certo desprezo pelos lugares aos quais estavam visitando, algo tipo:
ISTO AQUI É LEGAL, MAS LÁ NO BRASIL É QUE ...
Ou
OS ESPANHÓIS SÃO BACANAS, MAS NÃO TEM A ALEGRIA QUE A GENTE TEM E NEM...
O turista brasileiro acha que é a estrela máxima de sua própria viagem. Eu ainda não tinha 30 anos, mas lembro que achava aquilo bastante babaca.
Dentro de nosso país vejo isso acontecer com os gaúchos.
Gaúcho, quando viaja, sempre fala alto pra ser notado. Achamos que somos uma especialidade rara dentro do Brasil. Dá vergonha também. Por falar em especialidade, estamos nos especializando em fascismo, é bom que se diga.
Mas muda a cena.
Um tempo depois, no ano de 92, já no Brasil, liguei a TV pra assistir ao futebol num domingo de tarde.
Havia acontecido alguma coisa fora do previsto, pois o locutor lamentava algo. Estava na Globo e quem narrava era o Vanucci, aquele que entrava bebum no ar. Lembro que ele estava dizendo algo parecido com:
SÓ MESMO O BRASILEIRO, COM SUA IRREVERÊNCIA, CONSEGUE SUPERAR ESTE TIPO DE COISA.
Era um Fla- Flu lotado. 150 mil pessoas. Fui descobrindo que um dos parapeitos do Maracanã tinha se rompido e as pessoas começaram a cair pro andar de baixo.
Acabei de rever as cenas no YouTube agora mesmo. Foi terrível.
4 mortos e mais de 100 feridos. A tragédia aconteceu por falta de manutenção. A mureta estava frouxa e cedeu. As pessoas caíram em cima de outras pessoas de uma altura de 8 metros. Um pesadelo. Quando a coisa ruiu, aquela multidão ficou de cara para o vazio e havia o risco de haver uma avalanche humana.
Mas toca o barco e segue o jogo. Não pararam a partida. Impressionante.
E nossa irreverência basta para que passemos por cima disso?
4 mortos numa tarde de futebol?
Lembro que aquela frase do comunicador me incomodou muito. Como assim? Nossa irreverência faz com que não nos indignemos quando acontece uma tragédia destas?
Sabe o que eu acho?
Acho que nossa imagem, nosso perfil, a maneira como nos enxergamos, foi moldada pela rede Globo. Eu acredito piamente nisso.
Somos o país do futebol porque a Globo assim o disse. E acreditamos nisso até hoje, apesar de apanharmos de qualquer seleção menor.
E é assim que nos vemos: Irreverentes, simpáticos, criativos.
Somos os melhores do planeta.
Somos uns presunçosos que andamos pelas ruas da Europa falando que legal mesmo é o Brasil.
Além de afáveis, somos também pacíficos. Nos disseram que somos bonzinhos e acreditamos. Na verdade, somos otários. Somos comandados por uma rede de comunicação que traçou o nosso perfil e nos fez acreditar que somos muito especiais. Os europeus adoram vir ao Brasil, pois somos uns bobo alegres. Mas vai ser bobo alegre em Berlim, pra ver se os alemães não te dão uns paratequieto.
Estamos sendo moldados faz décadas, e acho que agora chegamos ao ponto de maturação que eles queriam. Nos tornamos um número imenso e irreversível de idiotas.
O Congresso brasileiro tem nossa cara. Nosso idiotismo está ali espelhado. Nossa torpeza, nossa vilania.
Há demanda para que Davi Coimbra, Kimtacategoria, Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi, e outros tantos, escrevam suas sandices irresponsáveis e perversas em jornais tendenciosos e por isto sejam aclamados. Há demanda pra estes caras.
Há demanda para que haja centenas de duplas sertanejas tocando a mesma música incessantemente pra deseducar mais e mais os ouvidos das pessoas.
Agora somos muitos. Somos uma gigantesca legião de idiotas. E precisamos alimento pra nossa alma pequena e nosso cérebro atrofiado.
Fazer este tipo de abordagem negativa tem sido taxado de complexo de vira-latas, eu sei, mas não tem outro jeito.
A coisa ficou insana demais.
Não passamos de um imenso aglomerado de idiotas formatados por uma empresa de comunicação.
Eu não entendia aquelas maneiras brasileiras de falar alto pra ser notado. Ficava me perguntando o porquê de nos acharmos tão especiais. Além disso, eu sentia que os brasileiros demonstravam um certo desprezo pelos lugares aos quais estavam visitando, algo tipo:
ISTO AQUI É LEGAL, MAS LÁ NO BRASIL É QUE ...
Ou
OS ESPANHÓIS SÃO BACANAS, MAS NÃO TEM A ALEGRIA QUE A GENTE TEM E NEM...
O turista brasileiro acha que é a estrela máxima de sua própria viagem. Eu ainda não tinha 30 anos, mas lembro que achava aquilo bastante babaca.
Dentro de nosso país vejo isso acontecer com os gaúchos.
Gaúcho, quando viaja, sempre fala alto pra ser notado. Achamos que somos uma especialidade rara dentro do Brasil. Dá vergonha também. Por falar em especialidade, estamos nos especializando em fascismo, é bom que se diga.
Mas muda a cena.
Um tempo depois, no ano de 92, já no Brasil, liguei a TV pra assistir ao futebol num domingo de tarde.
Havia acontecido alguma coisa fora do previsto, pois o locutor lamentava algo. Estava na Globo e quem narrava era o Vanucci, aquele que entrava bebum no ar. Lembro que ele estava dizendo algo parecido com:
SÓ MESMO O BRASILEIRO, COM SUA IRREVERÊNCIA, CONSEGUE SUPERAR ESTE TIPO DE COISA.
Era um Fla- Flu lotado. 150 mil pessoas. Fui descobrindo que um dos parapeitos do Maracanã tinha se rompido e as pessoas começaram a cair pro andar de baixo.
Acabei de rever as cenas no YouTube agora mesmo. Foi terrível.
4 mortos e mais de 100 feridos. A tragédia aconteceu por falta de manutenção. A mureta estava frouxa e cedeu. As pessoas caíram em cima de outras pessoas de uma altura de 8 metros. Um pesadelo. Quando a coisa ruiu, aquela multidão ficou de cara para o vazio e havia o risco de haver uma avalanche humana.
Mas toca o barco e segue o jogo. Não pararam a partida. Impressionante.
E nossa irreverência basta para que passemos por cima disso?
4 mortos numa tarde de futebol?
Lembro que aquela frase do comunicador me incomodou muito. Como assim? Nossa irreverência faz com que não nos indignemos quando acontece uma tragédia destas?
Sabe o que eu acho?
Acho que nossa imagem, nosso perfil, a maneira como nos enxergamos, foi moldada pela rede Globo. Eu acredito piamente nisso.
Somos o país do futebol porque a Globo assim o disse. E acreditamos nisso até hoje, apesar de apanharmos de qualquer seleção menor.
E é assim que nos vemos: Irreverentes, simpáticos, criativos.
Somos os melhores do planeta.
Somos uns presunçosos que andamos pelas ruas da Europa falando que legal mesmo é o Brasil.
Além de afáveis, somos também pacíficos. Nos disseram que somos bonzinhos e acreditamos. Na verdade, somos otários. Somos comandados por uma rede de comunicação que traçou o nosso perfil e nos fez acreditar que somos muito especiais. Os europeus adoram vir ao Brasil, pois somos uns bobo alegres. Mas vai ser bobo alegre em Berlim, pra ver se os alemães não te dão uns paratequieto.
Estamos sendo moldados faz décadas, e acho que agora chegamos ao ponto de maturação que eles queriam. Nos tornamos um número imenso e irreversível de idiotas.
O Congresso brasileiro tem nossa cara. Nosso idiotismo está ali espelhado. Nossa torpeza, nossa vilania.
Há demanda para que Davi Coimbra, Kimtacategoria, Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi, e outros tantos, escrevam suas sandices irresponsáveis e perversas em jornais tendenciosos e por isto sejam aclamados. Há demanda pra estes caras.
Há demanda para que haja centenas de duplas sertanejas tocando a mesma música incessantemente pra deseducar mais e mais os ouvidos das pessoas.
Agora somos muitos. Somos uma gigantesca legião de idiotas. E precisamos alimento pra nossa alma pequena e nosso cérebro atrofiado.
Fazer este tipo de abordagem negativa tem sido taxado de complexo de vira-latas, eu sei, mas não tem outro jeito.
A coisa ficou insana demais.
Não passamos de um imenso aglomerado de idiotas formatados por uma empresa de comunicação.
FC - setembro - 16 - pOa
sexta-feira, 16 de setembro de 2016
O PIQUETE
Ela entrou em casa na maior euforia. Tava elétrica. Encontrou o marido nervoso e preocupado.
- Puxa vida. Quanta demora. Que manifestação comprida esta!
- É querido. Não é fácil protestar. Tem de ter fôlego. Hoje estava lindo. Todo mundo no maior "Fora Temer".
- E este cabelo molhado?
- Ah, ah! E a polícia respeita a gente?
- Tacaram água em vocês?
- Ohhh...Muita!
- Mas vem cá. E este cheiro?
- Ah sim...eram baldes dágua.
- Peraí...este cheiro eu conheço.
- Sim. Fascistas colocam sabonetes de motel dentro dos baldes dágua.
- Como?
- Sim. Os fascistas estão cada vez mais perversos.
- Mas não era a polícia?
- Infiltrados.
- Fascistas infiltrados no meio da polícia jogaram em vocês baldes de água com sabonete de motel dentro?
- Ahã.
- Pra que???
- Minar a confiança das famílias. Semear a discórdia. Mas não passarão.
- Sério? Sei não. Parece meio demais isso. E esta marca no pescoço?
- Cassete.
- Cassete?
- Não!... quer dizer...cassetete.
- A polícia também bateu em vocês?
- Ohhhh...e como! Meteram o pau.
- Mas querida...estas manifestações estão ficando muito perigosas.
- Amanhã tem de novo.
- Ué. Não vi nada anunciado.
- Manifestação secreta. Pra não atrair polícia.
- Onde vai ser?
- No Botafogo.
- Que Botafogo?
- Quer dizer...na esquina, isso....na esquina democrática. Amanhã vamos tacar fogo.
- Vou contigo.
- Vai não.
- Por que???
- Você não tá preparado pra tanto movimento.
- Muita coisa?
- Ahã...te falei que em certo momento ele me deixa completamente sem ar.
- Ele quem?
- O piquete?
- Que piquete?
- Ai....a manifestação, amor... a manifestação.
- Puxa vida. Quanta demora. Que manifestação comprida esta!
- É querido. Não é fácil protestar. Tem de ter fôlego. Hoje estava lindo. Todo mundo no maior "Fora Temer".
- E este cabelo molhado?
- Ah, ah! E a polícia respeita a gente?
- Tacaram água em vocês?
- Ohhh...Muita!
- Mas vem cá. E este cheiro?
- Ah sim...eram baldes dágua.
- Peraí...este cheiro eu conheço.
- Sim. Fascistas colocam sabonetes de motel dentro dos baldes dágua.
- Como?
- Sim. Os fascistas estão cada vez mais perversos.
- Mas não era a polícia?
- Infiltrados.
- Fascistas infiltrados no meio da polícia jogaram em vocês baldes de água com sabonete de motel dentro?
- Ahã.
- Pra que???
- Minar a confiança das famílias. Semear a discórdia. Mas não passarão.
- Sério? Sei não. Parece meio demais isso. E esta marca no pescoço?
- Cassete.
- Cassete?
- Não!... quer dizer...cassetete.
- A polícia também bateu em vocês?
- Ohhhh...e como! Meteram o pau.
- Mas querida...estas manifestações estão ficando muito perigosas.
- Amanhã tem de novo.
- Ué. Não vi nada anunciado.
- Manifestação secreta. Pra não atrair polícia.
- Onde vai ser?
- No Botafogo.
- Que Botafogo?
- Quer dizer...na esquina, isso....na esquina democrática. Amanhã vamos tacar fogo.
- Vou contigo.
- Vai não.
- Por que???
- Você não tá preparado pra tanto movimento.
- Muita coisa?
- Ahã...te falei que em certo momento ele me deixa completamente sem ar.
- Ele quem?
- O piquete?
- Que piquete?
- Ai....a manifestação, amor... a manifestação.
quinta-feira, 8 de setembro de 2016
SQN
O SENSACIONALISTA faz um humor de esquerda. A gente lê e sabe que é humor. Isto deveria parecer óbvio, não é? SQN.
Eu explico.
Existe um site de humor de direita chamado JOSELITO MILLER – jornalismo destemido. O cara é bem engraçado, mas o que eu queria dizer é que a zumbizada lê aquilo e não entende que é gozação. Os zumbis acreditam com fervor nas manchetes do Joselito e compartilham furiosamente.
A Maria do Rosário é uma que o Joselito tira pra Cristo:
“Maria do Rosário cria projeto de lei que torna crime hediondo reagir a assalto”.
Ou
“Maria do Rosário cria projeto de lei que, como indulto de natal, cada família deve receber um apenado em casa para a ceia”.
Que tal?
Daí, os caras leem estas manchetes cômicas e enlouquecem. Acreditam e se revoltam. Enchem a mulher de desaforo, compartilham endoidecidamente. O fascista acredita naquela mentira escrita que ele gostaria que fosse verdade e vai criando assim o seu mundo fantasioso que flutua entre a ignorância e a perversidade.
Muda a cena.
Daí o Chico está no estúdio ou no camarim e começa a solar bobagens, e eu sei como é, porque frequento estes ambientes, e a imaginação vai longe, a gente tá feliz com a música e com as companhias e fala sem parar, e o Chico começa a brincar que suas canções são todas compradas, que ele as compra atualmente do Ahmed, seu mais novo fornecedor, e que ele sempre compra suas músicas.
Algum amigo, ou profissional, vai gravando toda esta besteirada antológica, junta tudo e edita um vídeo para inserir no making off do DVD CARIOCA, que é fantástico, e o vídeo é bom de ver, porque o Chico faz estas brincadeiras com a maior seriedade, com a maior cara de pastel.
Mas não é que a zumbizada descobriu o vídeo e se possuiu?
Ficaram animadíssimos com o fato do Chico comprar suas músicas. Finalmente o segredo veio à tona. Descobriram enfim os podres deste vendido. O falso gênio!
Então vá compartilhar que logo, logo isto vai virar um escândalo.
Mas não são toupeiras?
Os zumbis devem ficar ansiosos pra que chegue a hora do JN, pro tio Bonner dar a vergonhosa notícia pra todo o país e certamente ficam decepcionadíssimos quando isto não acontece.
Esta gente está contaminada pelo Ebola político, mais conhecido como a Síndrome do Lobão. Esta doença transforma o cérebro da pessoa numa ervilha, que quando irritada, se transforma ainda mais. Vira uma lentilha.
Já se pensou que a cura deste mal viria através da simples leitura de livros, mas esta teoria caiu por terra. O zumbi se nega terminantemente a ter contato com o conhecimento.
Eu explico.
Existe um site de humor de direita chamado JOSELITO MILLER – jornalismo destemido. O cara é bem engraçado, mas o que eu queria dizer é que a zumbizada lê aquilo e não entende que é gozação. Os zumbis acreditam com fervor nas manchetes do Joselito e compartilham furiosamente.
A Maria do Rosário é uma que o Joselito tira pra Cristo:
“Maria do Rosário cria projeto de lei que torna crime hediondo reagir a assalto”.
Ou
“Maria do Rosário cria projeto de lei que, como indulto de natal, cada família deve receber um apenado em casa para a ceia”.
Que tal?
Daí, os caras leem estas manchetes cômicas e enlouquecem. Acreditam e se revoltam. Enchem a mulher de desaforo, compartilham endoidecidamente. O fascista acredita naquela mentira escrita que ele gostaria que fosse verdade e vai criando assim o seu mundo fantasioso que flutua entre a ignorância e a perversidade.
Muda a cena.
Daí o Chico está no estúdio ou no camarim e começa a solar bobagens, e eu sei como é, porque frequento estes ambientes, e a imaginação vai longe, a gente tá feliz com a música e com as companhias e fala sem parar, e o Chico começa a brincar que suas canções são todas compradas, que ele as compra atualmente do Ahmed, seu mais novo fornecedor, e que ele sempre compra suas músicas.
Algum amigo, ou profissional, vai gravando toda esta besteirada antológica, junta tudo e edita um vídeo para inserir no making off do DVD CARIOCA, que é fantástico, e o vídeo é bom de ver, porque o Chico faz estas brincadeiras com a maior seriedade, com a maior cara de pastel.
Mas não é que a zumbizada descobriu o vídeo e se possuiu?
Ficaram animadíssimos com o fato do Chico comprar suas músicas. Finalmente o segredo veio à tona. Descobriram enfim os podres deste vendido. O falso gênio!
Então vá compartilhar que logo, logo isto vai virar um escândalo.
Mas não são toupeiras?
Os zumbis devem ficar ansiosos pra que chegue a hora do JN, pro tio Bonner dar a vergonhosa notícia pra todo o país e certamente ficam decepcionadíssimos quando isto não acontece.
Esta gente está contaminada pelo Ebola político, mais conhecido como a Síndrome do Lobão. Esta doença transforma o cérebro da pessoa numa ervilha, que quando irritada, se transforma ainda mais. Vira uma lentilha.
Já se pensou que a cura deste mal viria através da simples leitura de livros, mas esta teoria caiu por terra. O zumbi se nega terminantemente a ter contato com o conhecimento.
segunda-feira, 5 de setembro de 2016
BLACK BLOC SENIOR
Como já havia comentado, semana passada aderi a tal grupo.
Claro, que por motivos físicos não quebramos nada, mas arranhamos e riscamos tudo pela frente.
Na última manifestação chegamos mais cedo pois o comando havia marcado um campeonato de dominó e logo após bingo no qual fiz linha. A nota triste foi a detenção do companheiro Nelson que teve sua bolsa revistada por um PM.
Nelson já está em liberdade, felizmente, curtindo sua hidromassagem, pois afinal foi comprovada sua inocência por falta de provas mas aqui reproduzo a lista de objetos encontrados em sua bolsa que constou no BO para que se possa ver a injustiça cometida contra ele.
FLAGRANTES ENCONTRADOS NA BOLSA DE NELSON PALHARES – SEGUE LISTA
Um guarda-chuva
Uma caixa de lenços de papel
Leite de magnésia
Luftal
Uma garrafinha de chá de camomila (ainda geladinho)
Um celular Nokia do tamanho de um sapato (tão suspeito quanto uma pedra).
2 Viagras e meio
8 preservativos sexuais com validade vencida
3 fotos de nu frontal femininos
Uma cartela de bingo riscada
2 peças de dominó
1 bombinha de asma
Foi por este último item que prenderam Palhares. O PM ficou nervoso com a palavra bomba. E deu o teje preso. Injustiça grave. De posse desta lista nosso grupo também descobriu, com pesar, que o companheiro fraudou o campeonato de dominó e com isto estamos invalidando o mesmo.
Fernando Corona
Na última manifestação chegamos mais cedo pois o comando havia marcado um campeonato de dominó e logo após bingo no qual fiz linha. A nota triste foi a detenção do companheiro Nelson que teve sua bolsa revistada por um PM.
Nelson já está em liberdade, felizmente, curtindo sua hidromassagem, pois afinal foi comprovada sua inocência por falta de provas mas aqui reproduzo a lista de objetos encontrados em sua bolsa que constou no BO para que se possa ver a injustiça cometida contra ele.
FLAGRANTES ENCONTRADOS NA BOLSA DE NELSON PALHARES – SEGUE LISTA
Um guarda-chuva
Uma caixa de lenços de papel
Leite de magnésia
Luftal
Uma garrafinha de chá de camomila (ainda geladinho)
Um celular Nokia do tamanho de um sapato (tão suspeito quanto uma pedra).
2 Viagras e meio
8 preservativos sexuais com validade vencida
3 fotos de nu frontal femininos
Uma cartela de bingo riscada
2 peças de dominó
1 bombinha de asma
Foi por este último item que prenderam Palhares. O PM ficou nervoso com a palavra bomba. E deu o teje preso. Injustiça grave. De posse desta lista nosso grupo também descobriu, com pesar, que o companheiro fraudou o campeonato de dominó e com isto estamos invalidando o mesmo.
Fernando Corona
domingo, 4 de setembro de 2016
O BEIJO COMPRESSA
Tenho uma bola no estômago e uma dor de cabeça que é como se meu time tivesse perdido dez partidas seguidas por dez a zero. Me sinto humilhado. Me sinto indignado. Não sei como será a vida de agora em diante. Compor, tocar, escrever. Tudo isso vai ter de se passar dentro de uma nova paisagem. A paisagem do golpe, da infâmia. A indignação cresce com o correr do tempo. Ela não amaina. Então estou tentando aprender como administrar esta nova configuração. Daí resolvo sair pra quem sabe me embriagar um pouco e me vou em direção ao Odeon, que lá tem boa música, lá estão Jorginho do Trompete e Maurinho, com o qual ainda vou sentar ao lado pra ver se aprendo alguma coisa, e no Odeon bebo um par de chopes, mas estou ansioso demais e resolvo tomar o rumo da Cidade Baixa e quando chego no Marinho fico sabendo que houve manifestação com quebra quebra nas imediações e a noite está fraca por conta disso. De qualquer forma resolvo entrar, e por sorte encontro alguns bons companheiros de copo e assim podemos trocar ideias e lamentos encostados ao balcão. Isso serve pra desanuviar um pouco e há uma cerveja que não é de toda má, uma cerveja que desce fácil, é bom que se diga, e o grupo que está tocando samba é competente e faz bonito, num volume aceitável. Então vou me reconciliando um pouco com a vida, e vou flutuando pelos fantasiosos brilhos que a noite tem até o momento em que me chega a fome avassaladora e tenho tido a mania besta de apreciar Mac Donalds nas madrugadas, e é pra lá que me dirijo, depois de consultar a blitz no celular, pois a corrupção é uma tradição consagrada por estas bandas e eu não poderia deixar de confessar minha parte de culpa nesta geleia toda, e chegando lá, paro em frente ao caixa e peço o Número 1, pois nunca soube fazer outro pedido que não fosse o Número 1, e o atendente é um menino de negritude rara, certamente haitiano ou senegalês e penso em entabular alguma conversa amistosa com ele, mas seu olhar de quem ainda está atento a alguma dor antiga me impede de fazê-lo, me sinto coxinha na frente deste garoto que está a milhares de quilômetros de sua terra, então não o molesto com qualquer pergunta tola, me restrinjo a levar meu duvidoso banquete até alguma mesa pra dar início ao imediato devoramento das batatas que dia destes descobri ser um dos alimentos mais nocivos que existem, pois o azeite certamente foi usado muitas vezes, mas esqueço disto no exato momento em que escuto a meu lado uma menina de uns quinze, falando animadamente ao telefone, contando que "a Aline estava na fila do caixa agora mesmo e pegou alguém, tu acredita? a Aline beijou a boca de um cara desconhecido na fila do Mac" e daí penso que isto sim é que seria o must, isto sim é que seria um verdadeiro bálsamo pra meu espírito machucado e bêbado. Que estupenda fortuna seria encontrar em uma fila qualquer, alguma das milhares de almas gêmeas que possuo, como todo e qualquer ser deste planeta também possui, e se ela se iluminasse com minha presença, reconhecesse meu olhar e se decidisse a dar-me a honra de dividir um beijo, este beijo eu chamaria de beijo band-aid, ou quem sabe beijo aspirina, este providencial beijo eu batizaria de beijo compressa, que viria tão bem pra aliviar esta minha febre que já dura um tanto e sabe-se lá até quando vai, sabe-se lá até quando vai esta febre.
SETEMBRO - pOa - 16
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